Os novos intelectuais na trincheira da Batalha das Ideias
Em 1996, Fidel Castro, ao defender o socialismo como a construção de um novo sistema social e econômico a partir do exercício de poder e da reflexão sobre a prática do povo cubano, utilizou a expressão “Batalha de Ideias”. Ela, a “Batalha de Ideias”, recolocou a utopia no momento em que a hegemonia neoliberal buscava afirmar o “fim da história”. Essa convocação de Fidel foi responsável por colocar uma nova munição nas mãos dos povos: as ideias. As ideias valem mais que as armas da Guerra Fria quando são forjadas em processos de transformação com protagonismo popular.
Fomentar a construção dos intelectuais do povo (“novos intelectuais”) que identificam as condições de sua classe, interpretam e produzem uma compreensão radical do mundo contra as ideias dominantes, tem sido uma das tarefas do Campo Político do Projeto Popular desde então.
Nessa caminhada, os lutadores e lutadoras do povo consolidaram o tripé organização – formação – lutas, que sustenta o Projeto Popular para o Brasil como processo de resolver os problemas do povo, com povo, por meio da unidade de ação, pedagogia do exemplo, formação política e lutas que disputam consciência social (Conferência de Itaici, fundação da Consulta Popular, 1997).
E esse campo político ainda teve a ousadia de sonhar e criar condições para tornar realidade uma escola de formação política e uma editora popular como ferramentas necessárias para enfrentar a crise e travar a Batalha de Ideias na sociedade. Em 1998, desencadeou a campanha para a Construção da Escola Nacional Florestan Fernandes e a inauguração da Editora Expressão Popular (1999) no bojo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).
A Editora Expressão Popular é uma das principais ferramentas da Batalha de Ideias no Brasil e tem como objetivo expandir o acesso ao livro à classe trabalhadora e alimentar a militância de textos clássicos essenciais para formação de um/a lutador/a do povo brasileiro.
:: Expressão Popular: 20 anos contribuindo para a formação política no Brasil ::
Celebrar os 20 anos de sua existência (1999- 2019) é um reencontro do Campo Político do Projeto Popular com sua própria história e sentido de existir na esquerda brasileira. De alguma forma é compreender como, em meio a um contexto histórico de crise político-ideológica que tem como pano de fundo a derrocada da URSS e o avanço do neoliberalismo, numa conjuntura de intenso enfrentamento, como o massacre de Eldorado de Carajás (1996), esse Campo Político se constituiu em marcha: caminhando e dialogando com o povo na travessia até Brasília construindo força social em torno da luta por Emprego, Justiça e Reforma Agrária (1997) e por um Projeto Popular para Brasil (1999).
O ano de 2019 é um ano em que a conjuntura brasileira convoca a todos e todas para a Batalha de Ideias e os movimentos e organizações do Campo Político do Projeto Popular para o Brasil, celebrar os 20 anos da editora, reafirmando os valores de sua construção e avançando na disputa ideológica na sociedade.
É neste marco que o Instituto Tricontinental de Pesquisa Social se soma a essa trincheira ao lançar seu 13° dossiê O Novo Intelectual, dialogando com os valores constitutivos dessa construção brasileira e reivindicando as tarefas para os e as intelectuais do povo neste novo período. São valores imprescindíveis na formação da ideologia revolucionária presentes nos processos em que os “novos intelectuais” são forjados:
1) O valor do vínculo com o povo traduzido na inserção em legítimos processos de lutas;
2) O valor do estudo individual e coletivo na formação de militantes.
3) O valor da solidariedade num processo de elaboração coletiva e liberação de direitos autorais para classe trabalhadora.
4) O valor da troca de conhecimentos; o novo intelectual é um educador popular e um comunicador.
5) A profissionalização do trabalho da pesquisa engajada, criar condições para o pensamento crítico se desenvolver e fazer a disputa hegemônica.
6) A luta ideológica, mais que um valor é a razão de existir do novo intelectual: o rigor teórico, se apropriar da teoria marxista com rigor e aplicá-la com criatividade. Não temer romper a ordem e ser subversivo. Levar em conta a centralidade do poder político. Abandonar as distintas ideologias favoráveis à dominação. Utilizar todos os instrumentos intelectuais que estejam ao alcance para contribuir no diagnóstico que fundamenta a tática e a estratégia dos movimentos e organizações populares.
Enquanto nossos inimigos de classe dispõem de suas ferramentas ideológicas para nos convencer que é mais fácil imaginar o fim do mundo do que imaginar o fim do capitalismo, ou seja, as pessoas se sentem mais ameaçadas por uma calota polar inundando o litoral ou pelo rompimento de uma barragem de rejeitos do que pela causa desses fenômenos. Nós buscamos criar condições para combater as causas, ou seja, para enfrentar a dominação capitalista, não basta investigar os problemas do presente é essencial que participemos do debate sobre como será uma sociedade transformada.
Ao mobilizar os povos para resolver suas necessidades mais genuínas, devemos perguntar: qual sistema político estamos construindo?
Aqui entra a necessidade dos intelectuais em se dedicar de corpo e alma para essa tarefa de (re)significar o que é “participação” na política e em processos de transformação social. Assim como precisamos refletir profundamente por diversos caminhos criativos de como utilizar as riquezas sociais e as transformações no processo produtivo para resolver os problemas imediatos da humanidade – a fome, doença, catástrofe climáticas.
Nosso 13º dossiê é um convite para lutadores e lutadoras do povo imaginar o futuro de forma criativa e subversiva. O “novo intelectual” é um apelo mundial ao pensamento crítico, recebemos essa formulação no Brasil como um convite à unidade das diversas forças da esquerda, com mão estendida àqueles que partilham o desafio de formação política junto aos que estão em luta, aos que buscam qualificar sua intervenção na realidade para que seja transformadora.