Subsídios de conjuntura sobre a Defesa nacional
N° 08/21
Por Ana Penido e Rodrigo Lentz. Equipe: Anderson B. Moreira, Emilly F. O. De Lima, Jorge Rodrigues, Nilton Tubino, Pedro Bocca, Suzeley Kalil, Wilmar H. C. Amorocho
Este boletim mensal tem como objetivo acompanhar os temas relacionados às forças armadas no Brasil, com destaque para a participação militar na política. É produzido a partir de dados primários monitorados mensalmente. Nossas fontes são públicas: atos normativos publicados no Diário Oficial da União, movimentações na Câmara dos Deputados e os compromissos oficiais do alto escalão de militares no governo. Como fontes secundárias, são utilizadas matérias publicadas na imprensa e portais especializados. Boa leitura.
Destaques dos compromissos oficiais
Neste tópico nosso objetivo é trazer uma visão informativa do conjunto de compromissos oficiais daqueles militares que entendemos integrarem o Partido Militar. Em setembro foram identificadas 463 ocorrências, sendo 180 administrativas, e por isso desconsideradas. Com isso, restaram 283 ocorrências que compõem o universo analisado, com categorias que destacam os atores políticos mais frequentes.
Se comparado ao anterior, o mês de setembro foi bem menos movimentado, com redução de 28% dos compromissos oficiais. De maneira geral, Marcos Pontes, Tarcísio de Freitas e Bento Albuquerque seguiram como os “militares paisanos”: são os ministros que mais têm compromissos oficiais com as empresas privadas e parlamentares federais. Por outro lado, Eduardo Ramos e Braga Netto tiveram mais compromissos com o Presidente. Assim como no mês de agosto, seguiu quase inexistente a agenda com a sociedade civil e a frequência alta de encontros com empresas e autoridades dos EUA. Sobre esses campos de poder, seguem alguns destaques:
- Nas relações internacionais, permanece a ampla prioridade para compromissos junto aos EUA. O mês foi de agenda na assembleia geral da ONU, tradicionalmente aberta pelo Brasil. Dentre as diversas reuniões, merece destaque o encontro da comitiva presidencial liderada por Ramos com Mark Strand, presidente do “Congressional Institute”, ligado ao partido Republicano, sobre projeções das eleições legislativas dos EUA em 2022. Ramos também se reuniu com Juan González, diretor para “Hemisfério Ocidental” do Conselho de Segurança Nacional dos EUA. Na área energética, Bento Albuquerque reuniu-se com a nova Cônsul-Geral do Brasil em Houston, no Texas, e com a secretária de Energia dos EUA, Jenniffer Granholm, além de chefiar a delegação brasileira na conferência geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Destacam-se também as agendas de Mourão com primeiro-ministro e presidente do Egito, de Heleno com o presidente da Polônia e de Ramos com o primeiro-ministro do Reino Unido. De América do Sul, apenas reuniões pontuais com embaixadores da Argentina e da Colômbia, além de agenda de Mourão no Suriname para “relações diplomáticas” e com a Missão Diplomática de países da “Amazônia Oriental”.
Figura 1 – Compromissos oficiais em setembro de 2021
- Nas relações econômicas, os militares no governo seguem intensa agenda com a classe proprietária. Assim como nos meses anteriores, as áreas de Minas e Energia e Infraestrutura receberam maior atenção, muito por conta da crise energética e da agenda de privatização. Destaque para os compromissos com a Vale S.A. de Bento Albuquerque e Mourão, com visitas a instalações da usina hidrelétrica de Belo Monte. Bento Albuquerque se reuniu com representantes da Alcoa, empresa estadunidense de alumínio, e com “agentes do setor elétrico”. Por sua vez, Mourão participou de reunião virtual com o Grupo Gerdau e Tarcísio com o vice-presidente da New Fortress Energy, empresa de energia dos EUA. Na construção civil, Mourão manteve agenda com representantes da “Novonor”, nova empresa fantasia de Norberto Odebrecht. Nas demais áreas, Bento Albuquerque reuniu-se em duas oportunidades com a Anfavea; Mourão, Heleno e Marcos Pontes com o agronegócio; e, por fim, Fiesp e Ciesp foram recebidas por Bento Albuquerque com a pauta “situação energética”.
- No campo político, 16 deputados federais, 3 senadores e 1 senadora mantiveram compromissos oficiais, sendo a maioria com Tarcísio, Bento Albuquerque e Mourão. Além do PSL (RS, RJ, MG, SP), MDB (MG, PB, SC, ES), Patriotas (MG, PR) e PP (RS, SE) foram os mais frequentes. Ainda no parlamento, destaque para reuniões com ministros do TCU de Bento Albuquerque e Braga Netto. A agenda de mil dias ocupou todos os militares no governo, assim como a agitação política das comemorações de sete de setembro.
- Já nas forças armadas, chamou atenção a segunda reunião ministerial de governo em que o Comandante do Exército, general Paulo Sérgio, participa como integrante da equipe. Neste mês, os comandantes da Marinha e da Aeronáutica e o próprio ministro da Defesa estavam ausentes. Logo, foi o único “representante” das forças armadas na reunião de governo. Além disso, na véspera do sete de setembro, os comandantes das três forças também se reuniram com o presidente, além de Heleno e Braga Netto. Este, por sinal, participou de entrega de medalhas na Polícia Militar do DF. No geral, Braga Netto priorizou agendas com o Exército e Marinha, além de diversas reuniões com o Estado-Maior Conjunto. Das escolas, palestrou em dois eventos da ESG e compareceu ao Colégio Militares de Belo Horizonte (MG).
Destaques dos atos administrativos
Seguindo a fase exploratória de fontes primárias, aqui se busca capturar no Diário Oficial da União (DOU) as ações políticas oficiais desses militares na direção do governo. Nesta etapa, são analisadas as publicações assinadas pelo primeiro escalão governamental nas pastas: atos do Poder Executivo; Presidência da República; Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações; Ministério da Defesa; Ministério da Infraestrutura; Ministério das Minas &Energia; e posteriormente organizadas a partir de cinco eixos temáticos: projeto geral de governo, questões militares, questões de defesa, temas estratégicos, e ações administrativas/organizativas.
- Projeto geral de governo. O Ministério de Minas e Energia foi exemplar no acompanhamento da diretriz desestatizante, renovando contratos de concessão de bem público para a exploração de energia hidráulica, sem discussões, em média por 30 anos.
- Questões militares. Foi criada uma comissão dos Hospitais Militares sediados em Brasília. Manteve-se também a prática de distribuição de medalhas.
- Questões de defesa. Foram definidos os procedimentos relativos à Ouvidoria do Ministério da Defesa. Foram reconhecidos e descredenciados novos produtos estratégicos e novas empresas, com destaque para a Política de Compensação Tecnológica, Industrial e de Comercial de Defesa, definida em portaria do Ministério. Também ocorreram mudanças no Sistema de Inteligência de Defesa, buscando integrá-lo melhor ao Sistema Brasileiro de Inteligência. Mas as mais importantes medidas envolvem grandes mudanças organizativas. Uma delas foi a criação da Escola Superior de Defesa, com estrutura administrativa própria e voltada para o treinamento de civis. E foi reativada a 7ª Divisão de Exército, com sede no município de Recife (PE), subordinada ao Comando Militar do Nordeste do Exército Brasileiro. É a segunda divisão reativada desde o início do governo Bolsonaro.
- Temas estratégicos. Quanto à Amazônia, foi publicado o regimento interno do Conselho Nacional da Amazônia Legal; um memorando de entendimento entre o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia/Ministério da Defesa (CENSIPAM) e o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT); e definido o orçamento destinado ao Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica na Amazônia Legal. Na questão nuclear, foi criada a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A.
- Ações administrativas/organizativas. Ao longo do mês, muitas medidas administrativas corriqueiras foram tomadas, como a prorrogação de prazos, delegação de autoridade a subordinados, e autorizações para atividades em faixa de fronteira. Destaca-se a publicação da estrutura administrativa do Ministério da Infraestrutura após mudanças nas suas funções de confiança, e o Plano de Gestão do Ministério da Defesa até 2023.
Destaques dos atos do legislativo
Esta terceira exploração empírica visa capturar a incidência desse grupo de militares na produção legislativa a partir de propostas analisadas na Câmara dos Deputados, especificamente no Plenário (fase final), nas Comissões de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, de Segurança Pública e Crime Organizado (fase de intermediária) e na Distribuição de novas proposições de Projetos de Lei (fase embrionária).
Análise em Plenário
- PLP 112/2021. Institui o Código Eleitoral. Apresentação: 03/08/2021. Autoria: Vários. Estágio do Processo Legislativo: Aprovado com alteração no Plenário da Câmara. Encontra-se em apreciação no Senado. Resumo: Dispõe sobre as normas eleitorais e as normas processuais eleitorais brasileiras. Há emenda aglutinativa (nº 1), já aprovada em Plenário, que em seu artigo 170, inciso XIV, parágrafo 8, prevê quarentena a militares que se candidatem a cargos eletivos.
- MPV 1049/2021. Cria a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN). Apresentação: 17/05/2021. Autoria: Executivo. Estágio do Processo Legislativo: Tramitação em urgência. Aprovado em Plenário na Câmara com alterações. Aguardando apreciação pelo Senado Federal. Resumo: “Art. 1º: Fica criada a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear – ANSN, autarquia federal com patrimônio próprio, autonomia administrativa, técnica e financeira, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, e atuação no território nacional, sem aumento de despesa, por cisão da Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN”. O órgão seria responsável por monitorar, regular e fiscalizar as atividades que usam tecnologia nuclear no Brasil.
Das comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional, de Segurança Pública e Crime Organizado, e de Constituição e Justiça
- PL 9007/2017. Autoriza doação de viaturas MBB 1418 ao Exército do Paraguai. Apresentação: 03/11/2017. Autoria: Poder Executivo. Estágio no Processo Legislativo: aprovado na CCJ. Restam ainda análises na CREDN e da representação brasileira no Parlasul. Resumo: Autoriza o Poder Executivo federal a doar vinte viaturas operacionais MBB 1418 revitalizadas ao Exército Paraguaio.
- PDL 206/2021. Susta efeitos de artigo 4º do Decreto 10.341/2020 sobre emprego das Forças Armadas em GLO. Apresentação: 11/05/2020. Autoria: Tabata Amaral – PDT/SP. Estágio no Processo Legislativo: Rejeitado tanto na CREDN quanto na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e Amazônia – nesta comissão, o relator foi o coronel Chrisóstomo (PSL-RO). Resumo: Susta os efeitos do parágrafo único do art. 4º do Decreto nº 10.341 de 06 de maio de 2020, que “autoriza o emprego das Forças Armadas na Garantia da Lei e da Ordem e em ações subsidiárias na faixa de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas federais nos Estados da Amazônia Legal”. Questiona, na justificativa, o fato de no artigo em questão haver previsão de que tais operações seriam coordenadas pelo Comando responsável pela operação, estando as demais agências a ele subordinadas.
- PL 7226/2017. Visa conceder porte de arma sem restrições às praças que discrimina. Apresentação: 28/03/2017. Autoria: Rogério Peninha Mendonça – PMDB/SC. Estágio no Processo Legislativo: aprovado na CREDN com parecer favorável do relator, Coronel Armando (PSL-SC), no dia 29/09. Resta apreciação na CCJ e na Comissão de Segurança Pública. Resumo: “Dá nova redação às alíneas “q” e “r” do inciso IV do art. 50 da Lei no 6.880, de 9 de dezembro de 1980, para conceder porte de arma sem restrições às praças que discrimina”. Prevê amplo direito de porte de arma a membros das forças armadas, deixando eventuais restrições a critérios de cada força.
- PEC 94/2019. Permite também aos conscritos o alistamento eleitoral. Apresentação: 12/06/2019. Autoria: Coronel Chrisóstomo – PSL/RO. Estágio no Processo Legislativo: CCJ votou pela admissibilidade. Mesa Diretora da Câmara optou por criar comissão especial. Aguardando Constituição de Comissão Temporária pela Mesa. Resumo: “A presente Proposta de Emenda a Constituição visa extinguir o impedimento ao alistamento eleitoral aos militares durante o serviço militar obrigatório, os chamados conscritos”.
- PL 1144/2019. Dispõe sobre faixas de fronteiras. Apresentação: 26/02/2019. Autoria: Carlos Bezerra – MDB/MT. Estágio do Processo Legislativo: aguardando fluência do prazo para apresentação de recurso. Foi rejeitada na CREDN. Resumo: altera os artigos 1º, 2º e 3º da Lei nº 6.634, de 2 de maio de 1979, que dispõe sobre a faixa de fronteira. Propõe tratar cada caso em específico, estabelecendo faixas fronteiriças em tamanhos diferentes, a depender do estado.
Novas Propostas Legislativas
- PL 3362/2021. Estabelece competência da justiça comum para processar e julgar crimes sexuais praticados por militares em atividade ou assemelhado. Apresentação: 29/09/2021. Autoria: Vivi Reis – PSOL/PA. Estágio do Processo Legislativo: aguardando despacho do presidente da Câmara dos Deputados. Resumo: altera o Decreto-lei n• 1001 de 1969 (Código Penal Militar), estabelecendo a competência da justiça comum para o processamento e julgamento de crimes sexuais quando praticados por militar em situação de atividade ou assemelhado contra vítima civil ou militar.
- PL 3212/2021. Autoriza doação de blindados à República Oriental do Uruguai. Apresentação: 17/09/2021. Autoria: Executivo (acessório de MSC 454/2021). Estágio do Processo Legislativo: Apresentado à Mesa Diretora. Aguardando Despacho do Presidente da Câmara dos Deputados. Resumo: autoriza o Poder Executivo federal a doar dez Viaturas Blindadas de Combate Obuseiro Autopropulsado, do Comando do Exército, para a República Oriental do Uruguai.
- PL3132/2021. Regulamente a pensão das filhas de militares. Apresentação: 14/09/2021. Autoria: Darci de Matos – PSD/SC. Estágio do Processo Legislativo: apresentado à Mesa Diretora. Aguardando despacho do Presidente da Câmara dos Deputados. Resumo: em sua justificativa, o projeto afirma que o benefício se tornou anacrônico e injusto, não sendo condizente com os tempos atuais e tampouco extensível a outros setores da sociedade. O texto prevê, então, que a “alíquota da contribuição seja calculada com base no equilíbrio atuarial entre contribuições e benefícios”, e “permite que caso o militar que tenha optado por contribuir deseje renunciar ao direito, que ele possa receber os valores pagos, corrigidos pela taxa Selic”.
- Destaques para Monitoramento. 1) PL 149/2003 – altera código penal para incluir o crime de terrorismo – encontra-se na CCJ desde agosto, 2021; 2) PL 5365/2020 – altera o código penal para tipificar o crime de domínio de cidades. Coronel Tadeu (PSL-SP) foi designado relator na CCJ em 30 de agosto de 2021. Chances de o projeto ser retomado em resposta a acontecimentos recentes de grupos armados em cidades do interior de São Paulo; 3) PL 4895/2020 – cria o crime de intimidação violenta – em 14 de setembro de 2021 foi aprovado o parecer da relatora Margarete Coelho (PP-PI) na CCJ pela admissibilidade do texto e, no mérito, pela aprovação com substitutivo; 4) PEC 94/2019 – prevê a possibilidade de conscritos poderem votar nas eleições – apresentado pelo coronel Chrisóstomo (PSL-RO), em 08 de setembro de 2021 foi aprovado o relatório apresentado por Luis Philipe de Orleans e Bragança (PSL-SP), indicando ajustes, mas pela admissibilidade. Em 10 de setembro de 2021, ato da presidência da Câmara criou Comissão Especial para apreciação; 5) PL 1595/2019 – Antiterrorismo. Texto-base aprovado em comissão especial por 22 votos a 7. Texto irá a Plenário para apreciação.
Análise crítica dos principais temas de setembro
Nesta seção apresentamos uma interpretação dos principais temas sobre os militares na política e os assuntos de defesa nacional. A partir do acompanhamento exploratório da mídia corporativa, redes sociais e pequena imprensa digital, visamos apresentar uma síntese crítica das correntes da opinião pública.
- Internacional – Em visita ao Brasil, entre críticas à Venezuela, o chefe do Comando Sul dos Estados Unidos diz que forças armadas devem ser ‘apolíticas’. Atravessou o mundo a informação de ligações secretas entre o comando militar dos EUA e a China, preocupados com uma possível guerra iniciada por Trump no fim de seu mandato. O país também emitiu um alerta direcionado aos cidadãos estadunidenses recomendando cuidados em virtude dos protestos de 7 de setembro no Brasil, data em que o ex-braço direito de Trump – Jason Miller – foi detido para depoimento pela Polícia Federal. Enquanto isso, seguem os preparativos para o exercício combinado “core 2021” com o Exército dos EUA, no território brasileiro.
- Legislativo – Militares pressionaram para que Bolsonaro vetasse o artigo que revoga a Lei de Segurança Nacional, presente no Projeto de Lei aprovado no Senado que trata de crimes contra o Estado Democrático de Direito. Bolsonaro atendeu o parecer do seu ministro da Defesa, general Braga Netto, e vetou o artigo sobre “atentado ao direito de manifestação” (que poderia levar à punição de agentes de segurança que cometessem delitos em operações de GLO), e vetou punições mais altas para militares que cometessem crimes contra o Estado de Direito. Outro artigo que gerou controvérsias foi o de crime enganoso em massa, também vetado. Enquanto isso, o Movimento Vozes do Silêncio entregou ao STF um abaixo-assinado pela reinterpretação da Lei de Anistia. Outro tema relevante tratado no Legislativo e que contou com acompanhamento militar foi o Projeto de Lei antiterrorismo, que guarda diversos perigos à democracia brasileira, como denunciado em artigo de Ana Penido e Pedro Bocca. Até mesmo segmentos policiais se colocaram de maneira contrária ao Projeto. Também em tramitação e igualmente relevante é o código eleitoral em tramitação na Câmara, que conta com uma quarentena para juízes, procuradores, militares e policiais. Por fim, cabe lembrar o encerramento dos trabalhos da CPI da Covid-19, que implicou diversos militares em crimes, mas tem deixado intocado o general Braga Netto, então na Casa Civil. Amplo compilado do Intercept (incluindo documentos) aponta as responsabilidades do general-ministro.
- Militarização do Estado – tiveram foco durante o mês as indicações de militares à cúpula da Petrobrás sob o patrocínio do atual presidente, general Joaquim da Silva e Luna, dono de um salário superior a R$ 200 mil mensais. À frente de um terço das estatais, eles acumulam salários e ganham entre R$ 43 e 260 mil. Se por um lado a Controladoria Geral da União abriu um processo de auditoria para apurar pagamentos acima do teto a militares, a mesma entidade admite que as estatais vinculadas ao Ministério da Defesa, como a Imbel e a Amazul, não são fiscalizadas. Entretanto, a questão vai além de cargos, como aponta a inclusão do Exército entre as organizações responsáveis pelo treinamento do Ministério Público na produção de relatórios de inteligência. Outra medida relevante é o decreto de Bolsonaro que cria a Escola Superior de Defesa, mantendo a Escola Superior de Guerra. A medida não será um problema, uma vez que a proposta orçamentária para 2022 inclui aumento para o Ministério da Defesa, a quarta pasta com mais recursos do governo, receptadora de mais da metade dos investimentos previstos para o próximo ano (diante da perda orçamentária na saúde e educação). É importante lembrar que o Ministério da Defesa gasta 83,5% do seu orçamento com pessoal, enquanto, sem alimento, quartéis do Exército em Brasília liberam soldados mais cedo.
- Partido Militar – uma das principais características da geração de militares que hoje ocupa o governo é o isolamento diante do mundo civil, alerta Celso Castro. Alguns membros militantes do partido, como o Comandante da Aeronáutica Brigadeiro Baptista, escolheram movimentos populares, no caso dele o movimento negro, como vítimas preferenciais para as suas manifestações políticas. Outros, como o general Santos Cruz, têm se colocado em busca de uma terceira via na política, antagonizando com Bolsonaro e eventualmente conversando com o campo progressista. O partido militar fica apavorado com a possibilidade de receber a responsabilidade, além dos crimes na saúde, pelo apagão energético. Muitos coronéis tentam provar seus méritos, como o coronel comandante do colégio militar de Belo Horizonte acusado por maus tratos a alunos, ocorridos na ocasião da preparação para receber o Ministro da Defesa Braga Netto. Dinheiro para a militância partidária não falta, como os R$ 2.8 milhões recebidos anualmente do Ministério da Defesa pelo Clube Militar indicam. Diante de tanta militância, a Instituição optou por manter um baixo perfil nos protestos convocados pelo presidente para o 7 de setembro. O tradicional desfile foi substituído por uma exposição militar. A Instituição também tenta blindar os vexames, e a Marinha impôs sigilo de 5 anos aos documentos que basearam a Operação Formosa, que incluiu o desfile de blindados no Palácio do Planalto no último mês.
- Questões gerais. Pandemia – O Clube Militar e o Clube Naval conseguiram derrubar a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19 para que seus associados frequentem suas instalações. Amazônia – Um relatório parlamentar apontou que o gasto com operações de Garantia da Lei e da Ordem na Amazônia cresceu 178%, mas o desmatamento se mantém em alta, mostrando a ineficiência da militarização das questões ambientais. Sabendo dos danos de imagem, Exército e Poder360 fizeram uma longa reportagem de propaganda das ações militares na Amazônia. Tecnologia – A Guerra ao Terror deixou como legado a hipervigilância, e pessoas comuns passam a constar entre as “novas ameaças”. Por outro lado, Israel pode ter usado metralhadora com inteligência artificial para matar cientista do Irã. A pauta do “terrorismo” rendeu US$ 43 bi às corporações de tecnologia em contratos com o Pentágono. Justiça militar – servidora civil do hospital das forças armadas foi condenada no Superior Tribunal Militar a sete meses de detenção por desacatar uma major. Excepcionalmente, um general foi condenado por corrupção: R$ 1.8 milhão da unidade militar foram utilizados para reformar a piscina da unidade funcional ocupada pelo general. Ditadura – Finalmente a justiça condenou a Funai por campo de concentração dos indígenas Krenak durante a ditadura militar em Minas Gerais. Por outro lado, Delfim Netto deu uma longa entrevista em que afirma que voltaria a assinar o AI-5.
- Para estudar – O texto “como o Exército brasileiro falsifica a sua própria história” resume as questões em torno da mítica Batalha de Guararapes enquanto berço do Exército brasileiro. Uma pesquisa da revista sociedade militar aponta desconfiança da base militar no comando quando o assunto são medidas administrativas. Longa entrevista de Ana Penido sobre a conjuntura para a Carta Maior: “Os militares disputaram, abertamente, com o poder civil”.