“O socialismo é a melhor profilaxia!” O sistema de saúde da República Democrática Alemã
Apresentação da série Estudos sobre a RDA
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- A Saúde em um sistema doente
- Condições históricas nos anos anteriores à RDA
- TA abordagem integral na atenção à saúde
- Contradições e desafios
- Policlínica: uma abordagem moderna ao atendimento ambulatorial
- 5.1 Do consultório particular às policlínicas
- 5.2 A operação das policlínicas
- 5.3 Uma visão geral do setor ambulatorial
- Protegendo a saúde no local de trabalho
- Cuidados de saúde para mães e crianças
- Estratégias de vacinação
- A cooperação internacional e a solidariedade médica da RDA
- Por que o socialismo é a melhor profilaxia?
Apresentação da série Estudos sobre a RDA
A República Democrática Alemã (RDA) foi um Estado socialista fundado na Alemanha Oriental em 1949 como uma reação democrática e antifascista à Segunda Guerra Mundial e à subsequente restauração do capitalismo monopolista na Alemanha Ocidental. A RDA representou uma nova Alemanha, na qual a terra foi redistribuída, os meios de produção socializados e o sistema agrícola coletivizado. Estabeleceu sistemas igualitários de educação, saúde e assistência e garantiu direitos iguais entre homens e mulheres. Cultivou relações econômicas amistosas e estreitas com outros Estados socialistas e exerceu solidariedade política e material com países e movimentos que lutavam por independência na América Latina, Ásia e África.
O objetivo declarado da RDA era o estabelecimento de uma sociedade justa, baseada nos princípios da igualdade. Com a propriedade pública dos meios de produção como base, o país se transformou em um Estado industrial poderoso e eficiente, usou seu excedente econômico em benefício de seus cidadãos e lhes garantiu uma vida de seguridade social. Em última análise, a RDA teve sucesso em realizar seu principal objetivo sociopolítico: a satisfação das crescentes necessidades materiais e culturais de seu povo.
Mas por que se preocupar em reexaminar as conquistas, princípios e estruturas da RDA 30 anos após sua queda? O que podemos aprender com suas práticas econômicas alternativas no mundo atual, em que o triunfo do capitalismo exacerbou os problemas de desigualdade e pobreza e resultou em crises mais frequentes? Qual era realmente a aparência da democracia socialista? Quais contradições surgiram durante a aplicação cotidiana de uma economia planificada? Que lições podemos tirar da morte definitiva da RDA?
Com esta série, Estudos sobre a RDA, o Internationale Forschungsstelle DDR (International Research Centre DDR) junto com o Instituto Tricontinental de Pesquisa Social busca incentivar um novo engajamento com a história e os princípios da Alemanha Oriental. Nosso objetivo é reavaliar o legado e as experiências desse projeto de construção socialista. Usamos a sigla alemã DDR, ou Deutsche Demokratische Republik (português: RDA), especificamente porque muitas vezes representa um ponto de referência positivo em muitas partes do mundo e especialmente para países do Sul Global.
Estes estudos sobre a agenda e as realidades da RDA exploram aspectos da vida cotidiana, fornecem fatos sobre as conquistas sociais do país e examinam os fundamentos políticos e econômicos desse Estado socialista. Ao refletir sobre as experiências vividas na vida diária, que geralmente são deixadas de fora da narrativa dominante devido à vitória esmagadora do capitalismo e ao domínio da economia de mercado, procuramos dar uma contribuição útil aos debates que estão ocorrendo atualmente nos movimentos progressistas. Afinal, milhões de pessoas em todo o mundo ainda estão lutando por avanços que antes estavam garantidos no sistema socialista, mas que foram perdidos com sua queda.
Em 1990, após a reunificação da Alemanha, a economia da RDA foi desmantelada. O tratamento foi um protótipo de terapia de choque para as medidas de austeridade que logo foram impostas a outros países – e não apenas aos antigos Estados socialistas. Ao mesmo tempo, a RDA foi deslegitimada política, judicial e moralmente. As publicações desta série rejeitam a narrativa propagada por inimigos do socialismo, tanto novos quanto antigos, de que o fim da RDA prova o fracasso inevitável das políticas e das economias socialistas. Ao retratar as realidades da vida na RDA e afirmar as experiências de seus cidadãos, esperamos lembrar ao leitor que alternativas ao capitalismo existiram e existem.
Esta segunda publicação dos Estudos sobre a RDA explora a construção e expansão do sistema de saúde da Alemanha Oriental nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial. No contexto de recursos econômicos limitados e competição acirrada com a Alemanha Ocidental capitalista, a RDA foi capaz de desenvolver uma abordagem pioneira da Medicina, que colocou as pessoas acima dos lucros e enfatizou a importância das responsabilidades sociais na prevenção de doenças. Os insights obtidos com essa experiência histórica de construir um sistema de saúde eficaz e universalmente acessível podem servir como um quadro de referência para aqueles que lutam por uma sociedade organizada para e por trabalhadores.
1. A Saúde em um sistema doente
A maneira pela qual uma sociedade aborda questões de saúde revela muito sobre seu caráter geral. A prioridade dada à saúde das pessoas, o grau em que os indivíduos são protegidos e tratados com igualdade e até que ponto a atenção à saúde está voltada para as necessidades reais das pessoas pintam um quadro das condições sociais e políticas existentes.
A política de saúde não pode, no entanto, ser reduzida apenas ao sistema de assistência médica. Envolve condições de trabalho, nutrição, moradia e educação; o caráter das relações sociais; o comportamento cultural e de lazer; e uma série de outros fatores que formam a base sobre a qual a saúde física e mental das pessoas se desenvolve. A inter-relação entre esses elementos já estava sendo discutida na Alemanha durante o início do desenvolvimento do capitalismo. Um exemplo disso foi o trabalho do médico alemão Rudolf Virchow (1821-1902), fundador da patologia moderna e pioneiro do que era então chamado de “higiene social” [Sozialhygiene]. Esse campo, agora associado aos termos medicina social ou saúde pública, investiga a interação entre a saúde das pessoas e suas condições sociais. Friedrich Engels também forneceu evidências dessa conexão em seus primeiros trabalhos sobre a condição da classe trabalhadora na Inglaterra.
(…) acumula sobre eles [os pobres] todos os males possíveis. Se, em geral, a população das cidades já é demasiado densa, são os pobres os mais amontoados em espaços exíguos (…) Oferece-lhes alojamentos úmidos, porões onde a água mina do chão ou mansardas de cujo teto ela goteja. Constrói-lhes casas que não permitem que o ar viciado circule. Fornece-lhes roupas de má qualidade ou farrapos e alimentos adulterados ou indigestos (…) E se os pobres resistirem a tudo isso, vem uma crise que os transforma em desempregados e lhes retira o mínimo que até então a sociedade lhes destinara.
Dadas tais condições, como esperar que a classe mais pobre possa ser sadia e viva mais tempo? Que mais esperar, senão uma enorme mortalidade, epidemias permanentes e um progressivo enfraquecimento físico da população operária? Como é possível, sob tais condições, que a classe baixa seja saudável e tenha vida longa? (Engels, 2010, p. 137-38).’
— Friedrich Engels, um dos fundadores do socialismo científico, 1845
Sob o capitalismo, as proteções à saúde devem ser conquistadas em uma luta constante contra os interesses econômicos. As políticas de saúde pública são determinadas principalmente pelo setor privado e estão sendo cada vez mais reformuladas pelas forças do mercado.
A pandemia de Covid-19 revelou drasticamente as graves deficiências e os desafios não resolvidos dos sistemas de saúde hoje em dia. Muitos Estados carecem de estruturas de tomada de decisão claras e cientificamente fundamentadas. A cooperação solidária dentro e entre Estados é freada, acima de tudo, por interesses econômicos privados. As mortes são descaradamente comparadas às perdas econômicas de líderes políticos e empresariais. Em todo o mundo, as condições de vida e de trabalho das pessoas que recebem os salários mais baixos os deixavam mais vulneráveis à pandemia. Em muitos casos, não tiveram acesso a vacinas e medicamentos. A proteção dos direitos de patentes privadas é priorizada sobre o cuidado integral às pessoas. As populações do Sul Global ficam quase de mãos completamente vazias.
A eficácia geral dos sistemas de saúde no Norte Global é apontada como uma indicação de sua superioridade, mas seu potencial não é totalmente explorado, nem sua eficácia se deve apenas à força econômica ou às tradições médicas positivas. Em vez disso, foi a luta de décadas dos sindicatos e de outras forças democráticas que estabeleceu padrões mínimos e cuidados básicos. Posteriormente, as mesmas forças foram obrigadas a defender esses ganhos das constantes pressões do setor privado. Além disso, os sistemas de saúde dos Estados mais ricos são apoiados por trabalhadores da saúde vindos de países economicamente mais frágeis. Isso – juntamente com a exploração contínua do Sul Global – exacerba ainda mais o desenvolvimento desigual entre o Norte e o Sul. Hoje, o setor capitalista privado está consolidando seu controle sobre os sistemas de saúde, particularmente nas economias ocidentais, levando o setor a se tornar cada vez mais mercantilizado e subordinado à busca pelo lucro.
“A saúde, em vez de ser um sistema responsável, tornou-se uma mistura de feudos corporativos cujo objetivo central é maximizar a lucratividade dos investidores de capital de risco. Um sistema de saúde voltado para o lucro exige que o médico atue como uma espécie de guardião, decidindo se concede ou nega assistência médica. Um sistema de saúde voltado para o lucro é um oxímoro, uma contradição em termos. Se o cuidado gera lucro, não é mais um cuidado verdadeiro”.
— Professor Bernard Lown (1921-2021), cardiologista estadunidense e cofundador da International Physicians for the Prevention of Nuclear War (IPPNW)
Desde 1991, a proporção de hospitais e leitos privados na Alemanha aumentou tremendamente, continuando uma tendência de crescente comercialização de cuidados hospitalares que começou na República Federal da Alemanha (RFA, comumente chamada de Alemanha Ocidental) em meados da década de 1980. Esse desenvolvimento ganhou impulso adicional em 2003 com a introdução do sistema de cobrança inspirado nos EUA, baseado em grupos relacionados ao diagnóstico. Sob esse sistema, os casos hospitalares são classificados em diferentes grupos para identificar os “produtos” que os pacientes recebem e determinar o pagamento. Como tal, as decisões sobre o tratamento e a duração das internações hospitalares são cada vez mais tomadas com base no que pode ser faturado de forma lucrativa e não com base em critérios médicos. A qualidade dos cuidados de saúde está sendo corroída, à medida que o tratamento se torna cada vez mais dependente da renda do paciente e os serviços públicos de saúde são reduzidos.
O antagonismo entre os interesses do setor privado e os cuidados integrais de saúde para todos os membros da sociedade já havia sido reconhecido nos primeiros dias da República Democrática Alemã (também chamada de Alemanha Oriental). Ao longo de seus 40 anos de existência, a RDA foi capaz de construir e promover um sistema de saúde fundamentalmente diferente. De uma posição inicial de grande desvantagem econômica, a RDA passou a ser classificada entre os 20 maiores países industrializados em termos de produção econômica e padrões de vida até o final da década de 1980. O bem-estar de seus 16 milhões de habitantes refletiu-se em valores favoráveis, ou mesmo diretivos, em acordo com algumas medidas da Organização Mundial da Saúde (OMS), como a proporção médico-população, a mortalidade infantil e a redução da tuberculose. Isso ocorreu apesar da condição estrutural abaixo do ideal de muitas unidades de saúde, da escassez de suprimentos médicos e das restrições à importação de medicamentos e tecnologia – muitas das quais foram resultado de sanções econômicas impostas pelo Ocidente.
A RDA foi capaz de alcançar avanços significativos nos cuidados de saúde, tanto devido à influência das tradições progressistas transmitidas do século 19 e da República de Weimar (1918-1933) quanto devido a uma transformação radical das condições econômicas e políticas. Essa transformação permitiu ao jovem Estado reorientar os objetivos e a estrutura dos cuidados de saúde em torno de princípios sociais, ao mesmo tempo em que criou novas relações socialistas dentro e fora do local de trabalho, que melhoraram a saúde da população.
Este estudo avalia o sistema de saúde da RDA e traça vários de seus elementos centrais, examinando a importância do caráter socialista da RDA na construção de um sistema de saúde baseado principalmente em princípios preventivos. Esse esforço não prosseguiu sem suas dificuldades e contradições, e os insights obtidos com esse processo de construção de um sistema de saúde eficaz e acessível dentro do contexto de recursos econômicos limitados, podem servir como referência para as lutas em todo o mundo. O título, Socialismo é a melhor profilaxia! , presta homenagem a uma conhecida citação de Maxim Zetkin (1883-1965), médico, político e filho da militante comunista e internacionalista dos direitos das mulheres Clara Zetkin (1857-1933), que se tornou uma palavra de ordem na RDA. Em linha com o foco do sistema de saúde da RDA, essa palavra de ordem se refere à abordagem médica conhecida como profilaxia, que busca prevenir doenças antes que elas se manifestem.
2. Condições históricas nos anos anteriores à RDA
Condições sociais e de saúde devastadoras para o proletariado urbano surgiram no contexto da industrialização no Império Alemão (1871-1918). Depois de anos de campanha, a social-democracia revolucionária conseguiu introduzir o seguro social de saúde em 1883. Enquanto o então chanceler alemão Otto von Bismarck é lembrado como o pai fundador do seguro social organizado pelo Estado, na verdade foram as lutas da classe trabalhadora que exigiram e conquistaram concessões do governo. Bismarck nunca escondeu o fato de ter procurado afastar a influência política do movimento socialista operário. Durante uma sessão do Reichstag [parlamento alemão], ele comentou: “sem a social-democracia e sem o medo que ela gera em muitas pessoas, não teríamos feito as modestas reformas sociais que tivemos que conceder hoje”. A introdução desse sistema de seguro saúde ajudou a cobrir parcialmente o custo do tratamento, mas as inadequações permaneceram, pois as condições de trabalho não melhoraram e os trabalhadores tiveram que pagar dois terços das cobranças extras. Como resultado, organizações de saúde auto-organizadas, como a Federação Samaritana dos Trabalhadores (ASB, na sigla em alemão) e o Serviço Proletário de Saúde (PGD, na sigla em alemão), surgiram, complementando o trabalho do Partido Social Democrata da Alemanha (SPD, na sigla em alemão) e do Partido Comunista da Alemanha (KPD, na sigla em alemão), respectivamente, durante a República de Weimar. Essas organizações exigiram enfaticamente uma maior expansão dos cuidados de saúde pública.
Depois que o fascismo alemão chegou ao poder em 1933, os nazistas começaram a usar indevidamente a medicina para fazer valer sua ideologia racista e antissemita contra pessoas que alegavam serem inferiores, cometendo crimes contra a humanidade em uma escala sem precedentes. Após a derrota incondicional da Alemanha nazista em 1945, uma crise de saúde catastrófica atingiu a população alemã. A prevalência de epidemias, doenças e lesões revelou como as guerras continuam produzindo muitas vítimas mesmo depois do fim do combate militar. Hospitais, sanatórios e todo o sistema de saúde tinham sido destruídos no que depois se tornou a Zona de Ocupação Soviética (ZOS). O fornecimento de medicamentos entrou em colapso e as epidemias se espalharam incontrolavelmente, intensificadas por um grande afluxo de refugiados e pessoas reassentadas que chegavam da Europa Oriental. As mortes por tuberculose nesse período foram duas vezes maiores do que antes da guerra. Tifo, cólera, disenteria, infecções venéreas e doenças infantis devastaram a população. O número de médicos caiu pela metade em comparação com os níveis anteriores à guerra, e a formação de novos médicos foi interrompida pelo fechamento das universidades.
Desde a derrota do regime nazista em 1945 até a fundação da RDA em 1949, as políticas de saúde da ZOS foram moldadas com base em 30 ordens emitidas pela Administração Militar Soviética. As políticas foram então implementadas pela Comissão Econômica Alemã (órgão administrativo central alemão na ZOS) junto com a recém-criada Administração Central de Saúde e os cinco governos regionais na Alemanha Oriental. Uma questão imediata que a Administração Militar Soviética enfrentou foi como lidar com os médicos e outros profissionais de saúde que haviam apoiado o sistema fascista. Aproximadamente 45% dos médicos eram membros do partido nazista, muitos deles envolvidos na eutanásia e em outras atrocidades que ocorreram nos campos de concentração. Muitos desses indivíduos fugiram da ZOS, sabendo que seriam tratados com mais indulgência no Ocidente. Os médicos que permaneceram representavam um dilema político e moralmente difícil: decretar uma demissão geral de profissionais de saúde estava fora de questão – como havia sido realizada entre juízes e professores por um bom motivo -, por causa da crise sanitária que o país enfrentava. Como resultado, médicos que não haviam sido considerados culpados de nenhum crime foram autorizados a continuar seu trabalho, e muitos deles posteriormente se tornaram totalmente disponíveis para o novo sistema de saúde.
Exemplos de normas da política de saúde da Administração Militar Soviética:
1945: Estabelecimento da Administração Central de Saúde e os Escritórios de Saúde (Ordem n. 17).
1946: Revogação das leis racistas e outras disposições legais nazistas (n. 6);
Aprovação de uma norma para combater a tuberculose (n. 297).
1947: Introduzir um sistema uniforme de seguro social (n. 28); estabelecer um sistema de saúde no local de trabalho (n. 234); ordenar o estabelecimento de centros ambulatoriais e policlínicas (nº 272).
Outras normas estavam voltadas ao controle de doenças infecciosas e ao estabelecimento de instituições médicas e científicas.
Muitos dos médicos e profissionais de saúde a quem foram confiados cargos administrativos na coordenação geral da ZOS foram aqueles que se engajaram na resistência, emigraram ou foram presos sob o regime nazista. Suas tarefas imediatas foram ditadas pelas decisões das potências aliadas no Acordo de Potsdam, de 1945, e pelos partidos políticos recém-legalizados na ZOS. O Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED) foi formado em 1946, aglutinando os dois partidos da classe trabalhadora – o Partido Comunista da Alemanha (KPD) e o Partido Social Democrata da Alemanha (SPD) – em um único partido na ZOS, e reconheceu a necessidade de novas estruturas de saúde, especialmente no atendimento ambulatorial. Ao elaborar programas de política social e de saúde para uma Alemanha nova e democrática, as autoridades da ZOS se basearam nas demandas e experiências progressistas do período da República de Weimar.
“Como o pleno desenvolvimento do serviço de saúde só será garantido em uma sociedade socialista, ainda assim há um caminho para a Alemanha democrática. […] Essa é a nacionalização do serviço de saúde. Somente dessa forma os médicos, desfrutando de posições economicamente seguras e de recursos garantidos pelo Estado, podem se dedicar inteiramente às suas funções. Somente dessa forma as conquistas da ciência médica podem ser disponibilizadas para toda a população. […] A preservação da saúde e da capacidade produtiva dos trabalhadores é uma das tarefas mais importantes do país e um pré-requisito para a reconstrução. […] Portanto, a proteção da saúde deve ser uma questão para o Estado e, por isso, para a população como um todo. O objetivo deve ser garantir a todos a proteção de sua saúde como base da vitalidade e da aptidão física”.
— Diretrizes de política de saúde do Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED), março de 1947.
A tarefa agora era estabelecer um sistema funcional. Isso exigiu a nacionalização das instituições de saúde e a garantia do direito aos cuidados de saúde. O tratamento médico gratuito era fornecido por meio de um sistema universal, e a proteção deste era entendida como uma tarefa para todos os setores da sociedade. Separar as necessidades médicas das pessoas dos interesses privados do capital foi uma ideia decisiva e central na prestação de cuidados de saúde para todos; reconheceu-se que as corporações comerciais, particularmente em relação aos médicos autônomos que trabalham em consultórios privados, eram contrárias ao desenvolvimento progressivo da medicina. Essa observação já havia sido feita pela Liga das Nações, uma associação internacional de Estados fundada após a Primeira Guerra Mundial e precursora das Nações Unidas.
O sistema de saúde emergente da RDA foi moldado pelas experiências da União Soviética com seu sistema de saúde que, por sua vez, inspirou-se nas posições políticas da esquerda alemã durante o período de Weimar (1918-33). Após a Revolução Russa de 1917 e a Guerra Civil (1917-22), a jovem União Soviética se tornou o primeiro Estado na história mundial a construir um sistema de saúde que garantisse assistência médica gratuita e universal a toda a população, consagrando o direito à assistência médica gratuita na Constituição Soviética de 1936 como um dos direitos fundamentais do povo. De acordo com o modelo apresentado por Nikolai Semashko (Comissário do Povo para a Saúde de 1918 a 1930), as instalações e serviços médicos eram totalmente financiados pelo Estado e administrados nacionalmente, e um sistema multinível de hospitais, clínicas especializadas e sanatórios operava nos níveis nacional, regional, municipal e distrital. Embora aspectos do modelo soviético tenham influenciado a transformação do sistema de saúde na ZOS, ele não foi simplesmente replicado. Algumas das formas pelas quais o sistema da RDA diferiu, por exemplo, foram o grau de organização central e o fato de não ser financiado apenas pelo Estado.
3. A abordagem integral na atenção à saúde
“A política de saúde na RDA foi entendida como uma totalidade de medidas ideológicas, culturais, econômicas, sociais e médicas concebidas e praticadas com intensidade e qualidade variadas na esfera pública. O objetivo era ajudar a moldar e otimizar as condições ambientais da vida das pessoas de uma forma que proteja e promova sua saúde. Os pacientes deveriam ser tratados e cuidados usando o conhecimento e a experiência da medicina moderna. A vida deveria ser estendida de forma constante e progressiva”.
— Ludwig Mecklinger, ministro da saúde da RDA de 1971 a 1989.
A criação de relações socialistas de propriedade foi uma pré-condição crucial para a abordagem preventiva da RDA aos cuidados de saúde. Assuntos relacionados à saúde, como condições de trabalho, moradia, nutrição e educação, poderiam, portanto, ser gerenciadas pelo Estado e suas estruturas democráticas de tomada de decisão. O planejamento abrangente de instituições públicas possibilitou investigar e enfrentar os riscos diários à saúde. Nesse esforço, a RDA se baseou nas tradições da medicina social, que abordavam a saúde a partir de uma perspectiva sociopolítica e se concentravam na interação entre o bem-estar das pessoas e suas condições gerais de vida e trabalho. Em particular, o foco em cuidados preventivos no local de trabalho e para crianças, juntamente com um conceito moderno de atendimento ambulatorial, demonstrou o caráter unitário e holístico das políticas de saúde da RDA.
Ao organizar instituições de saúde como entidades estatais, a RDA superou a separação encontrada hoje em muitos países capitalistas entre os serviços de saúde financiados publicamente e o grande setor privado de atendimento ambulatorial e hospitalar. A eliminação das formas privadas de propriedade permitiu a integração de medidas preventivas, terapêuticas e de cuidados posteriores que produziram melhores resultados para os pacientes. Além disso, as inúmeras e diversas instituições médicas do país – de hospitais e clínicas a farmácias e centros de pesquisa – agora poderiam cooperar umas com as outras como parte de uma rede unificada liderada pelo Ministério da Saúde.
A rede hospitalar na RDA foi constantemente expandida para melhorar a acessibilidade dos cidadãos em todo o país. O sistema hierárquico, composto pelas divisões administrativas comunais, municipais e regionais, buscava fornecer cuidados básicos em hospitais municipais, enquanto o tratamento especializado seria administrado em hospitais regionais ou instituições e universidades nacionais. Antes da Segunda Guerra Mundial, as igrejas desempenhavam um papel significativo na manutenção e operação de hospitais em toda a Alemanha. Em vez de desmantelar essas estruturas, a RDA trabalhou com o clero para garantir que os cuidados de saúde de emergência estivessem disponíveis em todas as áreas do país. Assim, em 1989, dos 539 hospitais na Alemanha Oriental, 75 permaneceram sob a jurisdição das igrejas, embora eles também estivessem integrados ao sistema de planejamento do Estado.
A RDA também buscou superar a distribuição historicamente desigual de médicos nas áreas rurais e urbanas. Após a graduação, cada médico recebeu sua licença para exercer a profissão e garantir um emprego remunerado e foi obrigado a trabalhar por vários anos em uma área onde os médicos eram particularmente escassos, com base em um compromisso assumido no início de seus estudos. Essa política, conhecida como orientação de graduados [Absolventenlenkung], foi a solução da RDA para um problema sério que ainda assola muitos países hoje.
“Chegou um momento em que nos disseram: ‘Você se comprometeu a servir onde a sociedade precisa de você’. Muitos que estudaram em Berlim tentaram de tudo para ficar na capital e evitar ir a Cottbus ou Bitterfeld, por exemplo, ao distrito do carvão marrom, à terra. Eu disse para mim mesmo: ‘Bem, essas são pessoas que têm direito a cuidados médicos adequados. Eles não deveriam ser abandonados lá, então eu vou para lá’. Para mim, foi cumprir uma promessa que fiz em troca de poder estudar gratuitamente. Até recebemos uma bolsa de estudos que nos permitiu estudar sem dificuldades financeiras. Essa obrigação não contradiz minha compreensão de justiça de forma alguma, até hoje. Foi perfeitamente aceitável para mim”.
— Dr. Rüdiger Feltz, neurocirurgião.
Para financiar seu sistema de saúde, a RDA introduziu um amplo esquema de previdência social que cobria seguro saúde, acidentes e pensão e era administrado pelos próprios trabalhadores por meio da Federação Sindical Alemã Livre. Esse modelo unitário e organizado pelo Estado substituiu os sistemas de seguros fragmentados e orientados ao lucro que ainda operam em muitos países capitalistas hoje. Indivíduos na RDA pagaram até 10% de seus salários mensais ao programa, embora as contribuições tenham sido limitadas a 60 marcos por mês para os trabalhadores. As empresas então igualaram as contribuições de seus funcionários, e subsídios estatais adicionais cobriram quaisquer deficiências.
O peso político dado aos cuidados de saúde na RDA também é ilustrado na extensa legislação do país sobre o assunto. O direito universal aos cuidados de saúde, independentemente da situação social (que já havia sido ancorado na primeira constituição da RDA em 1949) foi consagrado nas duas constituições subsequentes de 1968 e 1974. Assim, a RDA realizou o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que afirma que “todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle”.
De acordo com a Constituição de 1968 da RDA, Artigo 35:
(1) Todo cidadão da República Democrática Alemã terá direito à proteção de sua saúde e força de trabalho.
(2) Esse direito deve ser garantido por meio da melhoria planejada das condições de trabalho e de vida; da promoção da saúde pública; da implementação de políticas de bem-estar abrangentes; e da promoção da atividade física, do esporte escolar e popular e do turismo.
(3) Em caso de doença ou acidente, a perda de renda e os custos de assistência médica, medicamentos e outros serviços médicos devem ser fornecidos por meio de um sistema de seguro social.
A RDA garantiu não apenas direitos e deveres básicos relacionados à saúde na esfera da assistência médica, mas também nas esferas do trabalho e da educação. Direitos iguais para mulheres, bem como proteção à saúde de crianças, jovens e idosos também foram codificados. Isso incluiu uma legislação internacionalmente elogiada que descriminalizou os atos homossexuais em 1968 (embora já estivesse isenta de processo legal desde a década de 1950) e legalizou o aborto em 1972. Outros estatutos significativos incluíram a introdução da responsabilidade estatal por danos à saúde causados por procedimentos médicos (1987) e a “solução de dissidência” para transplantes de órgãos (1975), que estabeleceu um modelo de consentimento presumido para doação de órgãos que exigia que os indivíduos fizessem uma declaração caso optassem por não participar.
Como se organizou o sistema de saúde da RDA em nível municipal. Fonte: Niemann, Heinrich (ex-especialista em medicina social na RDA e conselheiro distrital de saúde em Marzahn-Hellersdorf, Berlim). Em discussão com os autores. 2 jun. 2021. Escritório do IF DDR, Berlim.
O sistema de saúde da RDA era um setor altamente complexo que foi desenvolvido de forma gradual e sistemática ao longo de quatro décadas, empregando quase 600 mil pessoas – em 1989 – cerca de 7% da força de trabalho total. Além de hospitais e ambulatórios, esse setor incluía instalações de ensino e pesquisa médica; institutos especializados; serviços de emergência; sociedades científicas; editoras e revistas médicas; instalações de educação em saúde; e, por último, mas não menos importante, uma extensa indústria farmacêutica. Com 13 empresas, três institutos de pesquisa e aproximadamente 15 mil funcionários, a Kombinat GERMED – que significa ‘combinar’, uma espécie de corporação socialista – produziu cerca de 1300 produtos médicos diferentes, atendendo de 80 a 90% das necessidades farmacêuticas da RDA e, ao mesmo tempo, exportando produtos médicos para a União Soviética e outros países socialistas. A demanda doméstica por medicamentos era comunicada aos fornecedores não por meio das forças do mercado, mas por meio de cálculos dos farmacêuticos distritais. Os farmacêuticos, assim como os médicos, estavam livres das limitações impostas pela necessidade de gerar lucro, e os medicamentos eram fornecidos gratuitamente a todos os cidadãos. A estreita colaboração entre farmacêuticos e médicos permitiu que eles adaptassem o atendimento ao paciente e ajustassem os medicamentos em caso de escassez de suprimentos.
4. Contradições e desafios
O desenvolvimento do sistema de saúde da RDA não estava livre de conflitos e desafios. As contradições entre os objetivos na área da saúde e a capacidade econômica do país resultavam no fato de que as metas e aspirações declaradas nem sempre poderiam ser alcançadas. As políticas de saúde refletiram tanto as dificuldades econômicas enfrentadas pelo país quanto as mudanças nas prioridades políticas. Por exemplo, quando a Unidade de Política Econômica e Social foi introduzida em 1971 para aumentar o acesso a bens e serviços de consumo, o setor de saúde inicialmente se beneficiou de financiamento extra. No entanto, essa mudança na política de investimento para longe do setor industrial criou desequilíbrios na economia planejada que, em última análise, também foram sentidos no setor de saúde. Isso ficou evidente, por exemplo, no desgaste dos hospitais e na escassez de certos suprimentos e equipamentos médicos, o que dificultava as tarefas diárias dos profissionais de saúde. Em seus últimos anos, a RDA não foi mais capaz de importar tecnologia médica moderna desenvolvida nos países industrializados ocidentais na medida do necessário, em parte devido ao embargo imposto pelo Ocidente. Embora métodos diagnósticos e terapêuticos inovadores tenham permitido que a RDA progredisse contra certas doenças que antes se mostraram difíceis ou impossíveis de tratar por métodos convencionais, esses esforços eram frequentemente dificultados pela falta de equipamento.
Na década de 1980, gargalos no fornecimento de materiais, bem como visões divergentes sobre como lidar com questões urgentes de saúde, levaram à intensificação dos debates políticos. A abordagem preventiva do cuidado e a convicção de que todos os setores sociais tinham um papel a desempenhar na saúde pública foram fundamentais nas políticas governamentais. No entanto, surgiram disputas em torno da questão de quais condições causadoras de doenças poderiam e deveriam ser priorizadas. Por exemplo, às vezes havia uma ênfase em medidas que buscavam mudar comportamentos não saudáveis a fim de combater problemas como obesidade, abuso de álcool e aumento do tabagismo entre os jovens. Essa abordagem de focar em comportamentos individuais que contribuem para problemas de saúde foi criticada por especialistas em medicina social, que, em vez disso, focavam na melhoraria das condições gerais de vida e trabalho da população. Esses debates revelam que as dificuldades cotidianas e as questões estratégicas estavam abertas à discussão política, que muitas vezes acontecia em reuniões bimestrais regionais e conferências municipais semestrais de médicos, entre outros espaços.
A hostilidade do Ocidente em relação à RDA afetou o desenvolvimento de seu sistema de saúde de várias maneiras, exercendo uma influência ideológica, política e econômica sobre os trabalhadores e estruturas de saúde da Alemanha Oriental. Isso teve um impacto particularmente notável no acesso do país a material médico e técnico, bem como em iniciativas internacionais de pesquisa. Além disso, a Alemanha Ocidental buscou ativamente médicos da Alemanha Oriental, incentivando-os a migrar para o oeste. Médicos que tinham desfrutado de educação e treinamento gratuitos na RDA foram atraídos para o Ocidente por melhores salários ou por sua relutância em participar das transformações sociais em andamento no Oriente. Essa dinâmica impactou a RDA desde o início: o êxodo de médicos após a Segunda Guerra Mundial foi tão grande que teria exigido pelo menos cinco turmas adicionais de graduação de todas as escolas médicas da RDA para compensar a perda. Isso foi semelhante à situação em Cuba, onde – com exceções de médicos como Che Guevara, que se comprometeram com a revolução – muitos deixaram a ilha e migraram para os Estados Unidos depois de 1959. Esse fenômeno de “fuga de cérebros” – no qual médicos e outros profissionais altamente qualificados deixam os países mais necessitados – e suas consequências para o Sul Global são geralmente ignorados ou vendidos como um aspecto positivo da globalização.
Até que a fronteira entre a Alemanha Oriental e Ocidental fosse fechada em 1961, a RDA também estava realizando seu programa pioneiro de saúde em “competição” com a RFA; esta, por sua vez, preservou o modelo de consultório particular e usou deliberadamente altos salários e privilégios para incentivar médicos bem treinados a deixar a Alemanha Oriental. A RDA enfrentou, portanto, a mesma dificuldade que enfrentaram os bolcheviques após a Revolução de Outubro: como os profissionais especializados e os intelectuais, que haviam sido privilegiados pelo capitalismo, poderiam ser conquistados para a construção do socialismo? Dados os altos níveis de emigração, o SED decidiu fazer concessões à intelectualidade médica no final da década de 1950, utilizando incentivos materiais para incentivá-los a trabalhar e morar na RDA. Apesar desses desafios, novas mudanças de práticas privadas para empregos públicos prevaleceram nos anos seguintes. Embora vários milhares de médicos tenham deixado a RDA antes da construção do Muro em 1961, em 1988 o número de médicos no país (cerca de 41 mil) mais do que triplicou desde 1949, colocando a proporção médico-população da RDA em pé de igualdade com os outros Estados industrializados da Europa.
Como revelaram as experiências da RDA e de outros Estados socialistas, a transição social para além do capitalismo nunca é um simples desenvolvimento linear. A construção de um sistema de saúde integral e voltado para as pessoas não pode acontecer da noite para o dia. As transformações radicais devem lidar não apenas com as limitações econômicas de um país, mas também com as concepções tradicionais de papéis e status sociais. A escala da fuga de cérebros da RDA, por exemplo, levou o governo a fazer certos compromissos em sua missão de quebrar o monopólio de longa data da intelligentsia na profissão médica. Ao tirar lições para o futuro, não podemos isolar tais compromissos e deficiências de seu contexto histórico. É isso que diferencia as análises construtivas e progressistas daquelas que simplesmente buscam difamar e ridicularizar o socialismo.
5. Policlínica: uma abordagem moderna ao atendimento ambulatorial
5.1 Do consultório particular às policlínicas
Sob o modelo capitalista de saúde, o atendimento ambulatorial é comumente fornecido por médicos independentes em consultórios particulares individuais que estão espalhados pelas cidades. As tradições médicas progressistas, no entanto, há muito criticam esse modelo por ter duas limitações significativas. Em primeiro lugar, médicos autônomos dependem economicamente de pacientes doentes que buscam tratamento. Ou seja, eles são incentivados financeiramente não para prevenir doenças, mas para tratar os sintomas depois que eles se manifestam. Em segundo lugar, o rápido avanço da ciência melhorou muito a capacidade de diagnóstico e tratamento médico, mas esses novos métodos exigem acesso às mais recentes tecnologias e conhecimentos. Como os consultórios individuais não podem abrigar os diversos equipamentos e funcionários exigidos pela medicina moderna, os pacientes são encaminhados para especialistas ou centros de diagnóstico separados, muitas vezes criando ineficiências e discrepâncias nos diagnósticos. Na RDA, as policlínicas foram desenvolvidas para superar esses problemas no atendimento ambulatorial.
Como o nome indica, as policlínicas eram instalações nas quais várias especialidades médicas colaboravam em um mesmo espaço para prevenir e tratar uma ampla variedade de doenças. Mais especificamente, as policlínicas foram definidas como instalações ambulatoriais de propriedade pública contendo pelo menos os seguintes seis departamentos especializados: medicina interna, medicina oral, ginecologia, cirurgia, pediatria e medicina geral. Muitas policlínicas também abrigavam laboratórios de diagnóstico clínico, departamentos de fisioterapia e instalações de imagens médicas. Além disso, as policlínicas incorporavam a convicção de que, para ser eficaz, o atendimento médico ambulatorial deveria ser separado de considerações econômicas pessoais. Médicos e funcionários que trabalhavam em policlínicas eram funcionários públicos e, portanto, liberados de suas dependências econômicas tradicionais de pacientes doentes. Com uma posição segura e uma renda razoável, os médicos poderiam se concentrar principalmente nos cuidados preventivos.
Foi novamente a transição da propriedade privada que possibilitou essa reorientação fundamental do setor ambulatorial, que desempenha um papel importante, senão decisivo, na capacidade de um sistema de saúde atender toda a população. O atendimento ambulatorial eficaz garante que a ajuda médica de que as pessoas precisam esteja direta e rapidamente disponível onde elas moram, desde a prevenção e terapia até os cuidados posteriores e a reabilitação, o que ajuda a minimizar a permanência de pacientes internados em hospitais e, sobretudo, ajuda a prevenir doenças. O agrupamento de departamentos médicos, tecnologia e laboratórios sob o mesmo teto ajudou a superar os obstáculos burocráticos e financeiros que assolavam os consultórios particulares. Ao mesmo tempo, essa arquitetura facilitou uma colaboração mais eficaz entre profissionais médicos de diferentes áreas.
“[…] a verdadeira liberdade do médico não consiste no fato de que ele recebe os meios para garantir a saúde de cada cidadão, sem limitações? Ao construir o sistema estadual de saúde, os médicos não estão mais economicamente interessados em que as pessoas adoeçam; eles podem, em vez disso, agir genuinamente como guardiões e preservadores da saúde”.
– Discurso na Conferência Nacional de Saúde em Weimar, 1960.
Instituições menores que incorporavam a mesma abordagem das policlínicas eram chamadas de centros ambulatoriais (Ambulatorien) e normalmente abrigavam pelo menos três departamentos diferentes: medicina geral, medicina interna e pediatria. Mais de um terço das instalações ambulatoriais eram filiadas a hospitais e clínicas universitárias para promover a colaboração médica. Centros de consulta e consultórios individuais estatais operavam em locais mais remotos, mas estavam organizacionalmente vinculados às policlínicas para obter apoio.
A transformação do setor ambulatorial apresentou desafios únicos, tanto em termos de requisitos de infraestrutura quanto de novas funções dos profissionais de saúde, diferentemente do sistema hospitalar, que tinha uma história mais longa de propriedade pública. Havia, por exemplo, considerável ceticismo e até resistência à concepção de policlínicas entre os médicos. A ideia radical de empregar publicamente médicos especialistas para trabalharem juntos sob o mesmo teto contrastava fortemente com a autopercepção profundamente enraizada do médico “autônomo” que trabalha para si mesmo.
Vários precursores de grandes complexos médicos serviram de inspiração para o sistema policlínico da RDA, como a Casa da Saúde em Berlim, construída em 1923 durante a República de Weimar. Arquitetos da Bauakademie (Academia de Engenharia Civil) da RDA começaram a desenvolver e refinar projetos similares na década de 1950 sob a liderança do então presidente Kurt Liebknecht. Quando o imenso programa de construção de moradias da RDA foi anunciado no início da década de 1970, foi especificado que as policlínicas ou os centros ambulatoriais deveriam ser incorporados aos novos imóveis. Policlínicas maiores foram construídas em Berlim, bem como em outras grandes cidades, cada uma com mais de 50 médicos.
As associações conservadoras de médicos já haviam começado a se opor sistematicamente aos apelos para estabelecer policlínicas durante a era de Weimar e retomaram essa ofensiva após o fim da guerra em 1945. Os formuladores de políticas da RDA procuraram demonstrar as vantagens do novo modelo expandindo as capacidades técnicas e os laboratórios em policlínicas. Esse foi um processo gradual; por muitos anos, consultórios particulares continuaram a fornecer uma grande parte do atendimento ambulatorial.
Em última análise, foi possível conquistar gradualmente os profissionais médicos para o conceito de policlínica: em 1970, apenas 18% dos médicos ambulatoriais estavam em consultório particular, em comparação com mais de 50% em 1955. A rápida construção de instalações ambulatoriais eficientes em todo o país tornou evidentes as significativas vantagens práticas do novo sistema. O contraste entre os cuidados de saúde ambulatoriais na Alemanha Oriental e Ocidental aumentou gradualmente ao longo das quatro décadas após a fundação da RDA: em 1989, a grande maioria dos médicos ambulatoriais da Alemanha Ocidental ainda operava em consultórios privados, enquanto quase todos os da Alemanha Oriental estavam empregados no setor público naquela época.
5.2 The Operation of Polyclinics
Médicos e funcionários que trabalhavam em policlínicas eram empregados e remunerados pelo Estado, retirando motivos econômicos pessoais da relação médico-paciente e do processo de tomada de decisão médica. Em contraste com os consultórios particulares, as policlínicas estabeleceram uma cooperação desburocratizada entre especialidades individuais. Nos sistemas de saúde capitalistas, os médicos ambulatoriais autônomos geralmente têm sido (e muitas vezes ainda são) os únicos responsáveis pelas decisões médicas, enquanto as estruturas colaborativas nas policlínicas tornaram mais fácil para especialistas em diferentes disciplinas discutirem casos complicados ou, por exemplo, a prescrição de novos medicamentos e recomendações para novos tipos de terapia. Essa colaboração interdisciplinar também forneceu uma estrutura na qual a relação e a comunicação entre medidas preventivas, terapêuticas e de cuidados posteriores poderiam ser fortalecidas e aproximadas. Os serviços de imagens médicas e laboratoriais podiam ser solicitados imediatamente e geralmente estavam disponíveis em pouco tempo ou mesmo durante a consulta. As policlínicas também foram capazes de abrigar equipamentos médicos superiores, principalmente porque o uso comum era mais econômico do que o uso individual em consultórios particulares, e um sistema uniforme de arquivamento de registros de pacientes foi mantido para aumentar a eficiência e a comunicação entre especialistas.
Em média, as policlínicas contavam com cerca de 18 médicos, o que lhes permitiu estender o horário de funcionamento e continuar prestando cuidados mesmo quando estes profissionais estavam doentes ou de férias, ao contrário dos consultórios particulares. Além disso, isso permitiu que os médicos prestassem cuidados mais integrais aos seus pacientes, pois eles podiam combinar seu horário normal de consulta com visitas no local. Os pediatras, por exemplo, podiam realizar exames regulares em creches, enquanto outros médicos se encarregavam das consultas sem hora marcada em policlínicas.
“O fato de um médico sempre ter que se preocupar em como garantir sua renda e depender da procura de pessoas doentes não pode ser a solução. Outra saída deve ser encontrada. Ou seja, entender os médicos como funcionários bem remunerados do Estado que podem exercer suas funções independentemente de sua renda. Essa foi uma das ideias básicas da RDA. A segunda é que o desenvolvimento moderno da ciência não corresponde mais ao modelo da prática privada. Eu preciso de estruturas onde possa acessar o laboratório, máquinas de raio-X e especialistas. Essas duas ideias básicas levaram à criação gradual de policlínicas ou centros ambulatoriais. Foi um processo longo e que enfrentou resistência”.
– Dr. Heinrich Niemann, especialista em medicina social e ex-formulador de políticas.
O novo modelo de carreira em atendimento ambulatorial melhorou muito o ambiente no setor de saúde. Os funcionários receberam horário fixo de trabalho garantido, assistência médica interna, refeições organizadas pela comunidade e instalações de férias conjuntas para eles e suas famílias. É importante ressaltar que médicos, técnicos e enfermeiros foram todos empregados como membros da equipe; eram tratados igualmente de acordo com as leis trabalhistas e se organizavam dentro do mesmo sindicato. Essas medidas gradualmente ajudaram a corroer as hierarquias profissionais.
5.3 Uma visão geral do setor ambulatorial
O atendimento ambulatorial foi um componente central da abordagem preventiva da RDA à medicina, e sua expansão e sucesso em garantir que todos os cidadãos recebessem cobertura médica não apenas durante emergências, mas ao longo de suas vidas, representam, sem dúvida, o aspecto mais revolucionário do sistema de saúde do país. Para conseguir isso, uma vasta rede de infraestrutura foi desenvolvida em bairros, locais de trabalho, creches e áreas rurais. Por meio da propriedade pública e da natureza planejada da economia, tornou-se possível moldar as condições de vida e de trabalho levando em conta questões relacionadas à saúde.
Em 1989, essa rede era composta por 13.690 ambulatórios, 626 dos quais eram policlínicas. Aproximadamente uma em cada quatro dessas policlínicas operava em empresas industriais, usando o local de trabalho como espaço para fornecer cuidados de saúde consistentes, de qualidade e acessíveis à força de trabalho. Dos quase 19 mil médicos que trabalhavam no setor ambulatorial em 1980, 60% trabalhavam em policlínicas, 18,5% nos centros ambulatoriais menores e apenas 11% em consultórios médicos individuais.
A fim de estender os cuidados preventivos às áreas rurais e aldeias dispersas, centros ambulatoriais rurais foram construídos e contavam com até três médicos; os números dessas instalações aumentaram de 250, em 1953, para 433, em 1989. Em muitas cidades, os médicos trabalhavam em consultórios públicos ou trabalhavam temporariamente em consultórios de campo para oferecer aos residentes horários de consulta e visitas domiciliares, enquanto clínicas odontológicas móveis visitavam aldeias remotas para fornecer cuidados preventivos a todas as crianças. Além disso, a profissão de enfermeira comunitária foi desenvolvida no início da década de 1950 para aliviar a escassez inicial de médicos no campo: o número de enfermeiras comunitárias aumentou de 3.571, em 1953, para 5.585, em 1989. Essa extensa infraestrutura rural ajudou a fornecer às regiões menos densamente povoadas serviços médicos comparáveis aos disponíveis nas áreas urbanas.
“Não havia separação entre o trabalho assistencial e o trabalho social na enfermagem comunitária, então foi um desenvolvimento completamente lógico para os enfermeiros que os serviços sociais se tornaram parte do setor de saúde em 1958. […] Em aldeias onde não havia médico, a enfermeira comunitária era responsável por tudo relacionado à saúde, questões sociais e de higiene. Alguns se tornaram membros do conselho local e outros vice-prefeitos.
– Dr. Horst Rocholl, ex-médico municipal.
A revolução da RDA no atendimento ambulatorial foi além da construção da infraestrutura. Uma reforma abrangente também foi realizada no sistema educacional para quebrar as barreiras e hierarquias tradicionais no campo. Isso incluiu, entre outras medidas:
- Oferecer educação gratuita e salários fixos para cobrir o custo de vida dos estudantes e garantir que a medicina se tornasse acessível à classe trabalhadora e ao campesinato.
- Implementar medidas sociopolíticas, como programas integrais de cuidados infantis e educação à distância para tornar as profissões médicas mais acessíveis às mulheres, que, a partir do final dos anos 1970, constituíam mais de 50% dos estudantes de medicina no país.
- Transformar a enfermagem e profissões ligadas aos cuidados em funções altamente qualificadas e respeitadas por meio de programas intensivos de treinamento acadêmico.
- Disponibilizar pós graduação em especialidades médicas para todos os médicos.
No entanto, depois de 1990, o modelo de consultório particular da República Federal da Alemanha (RFA) foi rigorosamente imposto à Alemanha Oriental, desfazendo as conquistas da RDA no setor ambulatorial. Embora muitos profissionais da Alemanha Oriental tenham sido destituídos de suas credenciais após a incorporação da RDA, ninguém ousou questionar seriamente as qualificações dos profissionais de saúde da Alemanha Oriental: nos casos em que eles foram impedidos de praticar, o motivo era quase sempre político. Além disso, o fim do sistema policlínico representou “o maior erro na política de saúde” após a unificação, como o Dr. Heinrich Niemann argumentou perante o Comitê de Saúde do Parlamento Alemão em 1991 – uma avaliação corroborada pelo estado precário do sistema de saúde na Alemanha hoje. Embora a RFA tenha possibilitado, no final da década de 1990, que médicos ambulatoriais trabalhassem como funcionários em vez de autônomos, essas clínicas são quase exclusivamente de propriedade privada e carecem de uma estrutura unificada, e sua orientação comercial marca uma regressão significativa em relação à integração e financiamento público de instalações ambulatoriais da RDA.
6. Protegendo a saúde no local de trabalho
Na Alemanha Oriental, a saúde dos trabalhadores recebeu grande importância desde o início. Em 1947, durante o período em que a Alemanha ainda estava ocupada pelas quatro potências aliadas, a Administração Militar Soviética emitiu a Ordem n. 234 que estipulava que os locais de trabalho com mais de 200 funcionários deveriam instalar postos médicos, enquanto aqueles com mais de 5 mil funcionários deveriam estabelecer policlínicas corporativas. Em três anos, 36 policlínicas corporativas foram criadas e, em 1989, elas somavam mais de 150. As próprias empresas eram responsáveis pela manutenção dos quartos, móveis e custos operacionais dessas unidades de saúde, enquanto o sistema estadual de saúde fornecia e supervisionava a equipe médica e os equipamentos. Esse ponto representa um contraste decisivo com os cuidados de saúde ocupacional oferecidos atualmente em algumas empresas privadas: na RDA, os profissionais médicos que supervisionavam a saúde e a segurança ocupacional eram empregados pelo sistema público de saúde, não pela empresa em que trabalhavam. Como tal, foram os interesses dos trabalhadores, não dos empregadores, que orientaram suas decisões médicas.
Na primeira constituição da RDA de 1949, as proteções legais para a saúde dos trabalhadores foram estabelecidas junto com o extenso sistema de seguro social. Nas constituições subsequentes de 1968 e 1974, essas proteções foram ampliadas e sua implementação foi supervisionada pelos próprios trabalhadores: a Federação Sindical Alemã Livre, presente em todas as empresas e instituições da RDA, foi encarregada de monitorar a aplicação das disposições legais, relatando seus efeitos. Por lei, o local de trabalho representava muito mais do que meramente uma fonte de renda. As empresas forneceram a estrutura na qual os funcionários poderiam buscar interesses culturais e intelectuais juntamente com atividades recreativas. As brigadas de trabalhadores foram incentivadas a participar de eventos culturais e esportivos, discutir desenvolvimentos políticos e visitar acampamentos de férias mantidos pelas empresas. O Código do Trabalho da RDA de 1977, por exemplo, continha cláusulas para proteger e promover a saúde física e mental dos funcionários. Essa legislação demonstra ainda que os interesses dos trabalhadores determinaram a direção da economia.
O Código do Trabalho da RDA de 1977
§ 2 (4) A legislação trabalhista visa melhorar, de forma planejada, as condições de trabalho e de vida dos funcionários nas empresas: especificamente, expandir a proteção da saúde; aumentar a força de trabalho; melhorar os programas sociais, de saúde, intelectuais e culturais; e aumentar as oportunidades dos trabalhadores para tempo de lazer e recreação significativos. Garante aos trabalhadores segurança material em caso de doença, deficiência e velhice.
§ 17 (1) As empresas, conforme definidas por esta lei, são todas estabelecimentos e parcerias estatais, bem como cooperativas socialistas.
§ 74 (3) A empresa deve reduzir sistematicamente as condições de trabalho perigosas e limitar a quantidade de trabalho fisicamente difícil e monótono.
§ 201 (1) É dever da empresa garantir a proteção da saúde e da força de trabalho dos funcionários, principalmente organizando e mantendo condições seguras, livres de dificuldades e propícias à saúde e eficiência.
§ 207 Os trabalhadores que devem realizar trabalhos fisicamente exigentes ou perigosos para a saúde devem ser examinados clinicamente gratuitamente antes do emprego e em intervalos regulares, de acordo com a legislação.
§ 293 (1) A supervisão da saúde ocupacional nas empresas deve ser conduzida pela Federação Sindical Alemã Livre (FDGB) por meio de inspeções de saúde e segurança.
Assim como no setor ambulatorial, o sistema de saúde ocupacional foi gradualmente expandido. Em 1989, cobriu 7,5 milhões de trabalhadores de 21.550 empresas, ou 87,4% de todos os trabalhadores na RDA. Instituições especificamente dedicadas a esse campo — como policlínicas, centros ambulatoriais e postos médicos que operam em empresas — empregaram cerca de 19 mil profissionais de saúde. A medicina ocupacional também foi estabelecida como um importante campo de estudo, com aproximadamente um em cada sete médicos ambulatoriais especializados neste campo. O Instituto Central de Medicina Ocupacional empregou médicos e cientistas para pesquisar doenças relacionadas ao trabalho e desenvolver medidas preventivas, e a importância que esse setor exercia na RDA é evidenciada pelo fato de a RFA ter apenas metade do número de especialistas em saúde ocupacional, apesar da força de trabalho da Alemanha Ocidental ser três vezes maior do que de sua equivalente no Leste.
Em certas profissões, os funcionários eram expostos a substâncias perigosas e/ou condições físicas particularmente árduas. As autoridades de saúde fizeram campanhas para reduzir o número desses empregos, e as empresas foram obrigadas a informar sobre as medidas que estavam tomando para combater condições nocivas. No entanto, em certos setores da economia da Alemanha Oriental, como a indústria pesada, os processos de produção representavam ameaças inevitáveis à saúde dos trabalhadores. Em 1989, cerca de 1,69 milhão de trabalhadores permaneceram expostos a poluentes e estresses nocivos, como calor excessivo, ruído ou vibrações. Para minimizar os ferimentos que muitas vezes resultavam de tais trabalhos, a RDA forneceu cuidados direcionados aos trabalhadores expostos. Dos 7,5 milhões de trabalhadores monitorados pelo sistema de saúde ocupacional em 1989, cerca de 3,34 milhões receberam cuidados adaptados às condições específicas em que trabalhavam. Por exemplo, testes auditivos regulares eram realizados naqueles que trabalhavam na construção civil, enquanto exames pulmonares regulares eram realizados em quem trabalhava em fábricas de produtos químicos. Paralelamente a essas medidas, inspetorias especializadas em saúde ocupacional monitoravam a conformidade das empresas com os padrões de segurança e especificaram limites para substâncias nocivas ou estresses no trabalho.
O campo da saúde ocupacional foi particularmente importante no contexto do embargo comercial da RFA, que fez com que a RDA dependesse fortemente da única fonte de energia disponível na Alemanha Oriental: o carvão marrom, uma substância à base de linhita que emite considerável poluição quando queimada. Essa necessidade econômica, juntamente com deficiências na modernização técnica em algumas empresas, levou à permissão de isenções especiais em relação a exposições nocivas em alguns locais de trabalho. A saúde e a segurança ocupacionais tornaram-se, portanto, um campo controverso, à medida que as autoridades debateram quais prioridades deveriam ser estabelecidas. Ludwig Mecklinger, ministro da saúde da RDA de 1971 a 1989, reconheceu esse dilema, afirmando que as políticas de saúde foram inevitavelmente restritas por necessidades econômicas e fatores externos.
O estresse mental relacionado ao trabalho foi outra questão importante na RDA e se tornou o foco do campo da psicologia ocupacional. Aqui, descobertas significativas foram feitas pelo estudioso Winfried Hacker, que concentrou sua pesquisa na regulação psicológica da atividade laboral no contexto da sociedade socialista, onde a maior satisfação das necessidades das pessoas exige maior produtividade do trabalho. De acordo com Hacker, o trabalho deve ser projetado de forma que não apenas mantenha a saúde dos trabalhadores, mas também promova seu desenvolvimento psicológico: um trabalho monótono e separado das realidades vividas pelos trabalhadores levará à alienação, enquanto uma relação saudável com o trabalho deve ser multidimensional e permitir trabalhadores a desenvolver a si mesmos e os produtos de seu trabalho ao mesmo tempo. Para explorar essas ideias, Hacker e sua equipe de pesquisadores desenvolveram métodos para identificar características objetivas no local de trabalho que impactaram positivamente a saúde e o desenvolvimento psicológico e medir como elas afetaram as percepções subjetivas. Embora as propostas de Hacker não tenham sido implementadas em grande escala, sua pesquisa estabeleceu o padrão em psicologia ocupacional. O trabalho de Hacker diferiu das abordagens predominantes da psicologia ocupacional no capitalismo, que priorizam o aumento da eficiência dos processos de trabalho em vez do desenvolvimento da saúde e do estado mental dos funcionários.
Hoje, o enfraquecimento do poder sindical e o aumento do emprego precarizado levaram à deterioração das condições de trabalho na maioria dos Estados capitalistas. Embora tenha havido avanços nos próprios processos de produção, novos encargos com a saúde estão surgindo constantemente, especialmente em relação aos locais de trabalho digitais, juntamente com a agricultura e as indústrias alimentícias. Como tal, a importância da saúde ocupacional só aumentou, e as experiências da RDA neste campo permanecem relevantes não apenas do ponto de vista médico, mas também ao demonstrar que uma abordagem fundamentalmente diferente da proteção da saúde no local de trabalho é possível.
7. Cuidados de saúde para mães e crianças
Na Alemanha Oriental, as mulheres tiveram acesso a cuidados de saúde de primeira linha, emprego garantido, e as crianças tinham acesso a cuidados infantis integrais. Essas conquistas sociais significaram que, em 1989, a taxa de emprego entre as mulheres havia atingido 92%. Ao mesmo tempo, a partir da década de 1970, a Alemanha Oriental também teve uma taxa de natalidade mais alta do que a Ocidente, em grande parte devido à expansão contínua da infraestrutura social e de saúde do país, que permitiu às mulheres buscar emprego e criar uma família saudável.
O desenvolvimento desta infraestrutura foi estabelecido na legislação da RDA, que provou ser consistentemente mais progressista do que na RFA, onde as leis patriarcais refletiam conceitos familiares burgueses, como a dona de casa. A Lei de 1950 da RDA sobre Proteção de Mães e Crianças e Direitos das Mulheres, por exemplo, prescreveu uma ampla expansão de creches e instalações de saúde para crianças, apoiando explicitamente mães solo e trabalhadoras. Enquanto em 1956 apenas 10% das crianças frequentavam creches, em 1990, quase 80% das crianças de 0 a 3 anos e 94% das de 3 a 6 anos frequentavam creches. Na época, essas eram algumas das maiores taxas de cobertura de creches do mundo. Os comitês de mulheres dentro dos sindicatos foram fundamentais na introdução e supervisão de novas leis para tratar da necessidade de equilibrar as responsabilidades familiares e profissionais. Um resultado, por exemplo, foi o estabelecimento de creches corporativas diretamente conectadas ao local de trabalho. Por meio da socialização das responsabilidades de cuidar de crianças, as mães puderam trabalhar e, ao mesmo tempo, criar os filhos e, assim, desenvolver a independência econômica de seus parceiros. Isso se refletiu na taxa de divórcio da Alemanha Oriental, que permaneceu significativamente maior do que na RFA durante os 40 anos de existência da RDA. Essa tendência foi dramaticamente revertida após 1990, quando os níveis de emprego das mulheres caíram drasticamente na antiga Alemanha Oriental.
As creches também desempenharam um papel central nas políticas de saúde. Essas instituições foram monitoradas ativamente pelo Ministério da Saúde e, no caso das creches, até mesmo colocadas diretamente sob sua responsabilidade e não sob o Ministério da Educação. Isso possibilitou a criação de padrões sociais e de saúde unitários para promover o bem-estar das crianças, como visitas pediátricas regulares às creches para realizar vacinas e exames médicos periódicos feitos diretamente em creches e escolas, tornando os cuidados de saúde parte integrante do cotidiano das crianças. Dessa forma, manter uma boa saúde e prevenir possíveis problemas tornou-se uma responsabilidade social que não era mais deixada apenas para os pais.
Em 1965, a Lei do Sistema Educacional Socialista Unificado tornou a saúde um pilar central da educação e estabeleceu requisitos de qualificação para o pessoal em creches e escolas. A psicologia e a pedagogia infantil foram enfatizadas em programas de treinamento para trabalhadoras/es das creches. O desenvolvimento da primeira infância foi observado de forma aguda pelos educadores para avaliar, por exemplo, a adaptação das crianças ao ambiente familiar e social. Quando necessário, a equipe da creche organizava consultas com os pais para discutir recomendações práticas para o cuidado diário. A Associação Profissional de Pediatria (Medizinischen Fachgesellschaft für Pädiatrie) também convocou grupos de trabalho interdisciplinares regulares, juntamente com a equipe de cuidados infantis, para avaliar o estado das creches e escolas de educação infantil. Esses grupos elaboraram propostas políticas e emendas legislativas, bem como sugestões para projetos-piloto.
Além de oferecer creche gratuita para todas as famílias, a RDA se esforçou para quebrar tabus culturais e promover a saúde de mulheres e crianças, independentemente de suas circunstâncias. O Código da Família de 1965, por exemplo, eliminou a categoria legal discriminatória de “filhos nascidos fora do casamento”, enfatizando o papel de ambos os pais na criação de um filho. A Lei de 1972 sobre a interrupção da gravidez também contribuiu para a autodeterminação e o planejamento familiar das mulheres ao introduzir o acesso gratuito e legal a anticoncepcionais e abortos até a 12ª semana de gravidez. Em contraste, a constituição da República Federal da Alemanha contém uma cláusula que criminaliza o aborto até hoje e, desde 1976, as mulheres são obrigadas a comparecer a uma sessão de aconselhamento obrigatório para receber uma autorização.
As mulheres grávidas da RDA tiveram a garantia de consultas pré e pós-natais abrangentes para ajudar e monitorar as mães e seus filhos. Em 1989, havia mais de 850 centros de atendimento para grávidas em todo o país para orientar gestantes em questões médicas e sociais. Após o nascimento, cerca de 9.700 centros para gestantes examinaram regularmente os bebês e ajudaram os pais em suas novas funções. Os exames médicos periódicos acompanharam as crianças até a idade adulta. É importante ressaltar que o atendimento odontológico também foi integrado aos exames preventivos em creches e escolas, novamente em contraste com a maioria dos sistemas de saúde atuais, nos quais a saúde bucal não é garantida publicamente e, em vez disso, é deixada sob a responsabilidade, financeira inclusive, dos pais. Juntas, essas estruturas e políticas ajudaram a garantir que o planejamento familiar e o desenvolvimento infantil pudessem acontecer independentemente de questões econômicas.
8. Estratégias de vacinação
A pandemia da Covid-19 revelou as desigualdades e ineficiências da produção e distribuição da vacinação no mundo capitalista atual. Por um lado, os direitos de propriedade intelectual têm sido priorizados sobre a saúde pública, levando ao apartheid vacinal, no qual países do Norte Global acumularam doses suficientes para vacinar suas populações três vezes mais, enquanto a maioria dos estados do Sul está impedida de reproduzir essas vacinas. Se não fosse pela cooperação Sul-Sul liderada por países como Cuba e China, as taxas de vacinação nos Estados mais pobres seriam muito menores do que já são. Por outro lado, em uma reviravolta de ironia, os mesmos Estados que estocam vacinas no Norte Global estão lutando para convencer um quarto ou até um terço de suas populações da eficácia e segurança da imunização contra a Covid-19.
Como em muitos outros Estados socialistas, a RDA conseguiu atingir taxas de vacinação particularmente altas durante suas quatro décadas de existência. Um exemplo claro disso foi a campanha contra o vírus da poliomielite. Em 1961, enquanto a Alemanha Ocidental ainda estava registrando mais de 4.600 casos de pólio, a Alemanha Oriental reduziu seu número de casos para menos de cinco. A RDA fez uso de uma vacina oral produzida na União Soviética e, posteriormente, ofereceu 3 milhões de doses à RFA, mas esta declinou. Enquanto a Alemanha Oriental registrou seu último caso de pólio em 1962, os casos continuaram sendo registrados na Alemanha Ocidental até o final da década de 1980.1980s.
As diferenças na velocidade e eficácia com que os dois Estados alemães combateram a pólio decorrem de duas abordagens fundamentalmente diferentes de imunização. Na RDA, como na maioria dos outros Estados socialistas e em alguns países ocidentais, a vacinação infantil era obrigatória desde o início dos anos 1950, e todas as crianças recebiam uma série de imunizantes definidos pelo Ministério da Saúde. Essas vacinas foram administradas às crianças diretamente nas creches e escolas, enquanto os adultos eram vacinados no local de trabalho. Indivíduos que não quisessem ser vacinados ou vacinar seus filhos (o que ocorreu principalmente por motivos religiosos) poderiam obter uma isenção após consultas com um médico e autoridades regionais de saúde. As vacinas e os cuidados de saúde de forma mais ampla foram, portanto, tratados como uma tarefa social na RDA, e uma ampla gama de atores sociais, sejam médicos, professores ou pais, garantiu que todas as crianças recebessem medicamentos e cuidados preventivos.
Na RFA, por outro lado, as vacinas eram recomendadas, mas não obrigatórias, e era responsabilidade das famílias marcar consultas com um pediatra para vacinar uma criança. O Comitê Permanente de Vacinação (STIKO), uma comissão honorária de médicos especialistas, fazia recomendações de vacinação e os médicos eram então solicitados a administrar, e remunerados por isso, mas não foram implementados nas escolas ou no local de trabalho programas públicos de vacinação. Portanto, para os médicos da RFA, o incentivo à vacinação era principalmente financeiro e não médico.
O foco do discurso político atual sobre a legalidade das vacinações obrigatórias subestima e muitas vezes falha em reconhecer a questão prática crucial de como o Estado pode cumprir sua obrigação de organizar a vacinação para todos os cidadãos de maneira eficiente e segura. No entanto, ainda há uma dúvida sobre se as condições básicas para um programa de vacinação em massa foram estabelecidas ou não em uma determinada sociedade. Isso inclui:
- Garantir os recursos para assegurar que todos os cidadãos possam ser vacinados. Mais especificamente, isso significa produzir ou adquirir doses suficientes para todos os cidadãos, garantir que as instalações sejam seguras e acessíveis e empregar pessoal médico suficiente para administrar as vacinas.
- Coordenação e monitoramento de vacinações em um sistema único. Uma das razões pelas quais certas doenças continuam a se espalhar apesar das campanhas de vacinação é que os indivíduos se esquecem de organizar a segunda ou terceira dose necessária para a imunização completa. Essa é uma limitação séria das estratégias de imunização voluntárias, nas quais os indivíduos devem acompanhar e organizar suas próprias doses de reforço.
- Manter a confiança do público nas vacinas e nas instituições e atores que as fornecem, ou seja, o Estado, os produtores farmacêuticos e os profissionais médicos. Por exemplo, as empresas privadas estão recebendo financiamento público para desenvolver vacinas que depois serão patenteadas e com as quais se obterá lucro, ou o Estado está pesquisando e desenvolvendo vacinas que serão acessíveis e benéficas para todos?
As vacinações obrigatórias na RDA foram finalmente atendidas por um público que estava altamente disposto a ser vacinado. O uso da coerção para aumentar as taxas de vacinação – uma questão muito debatida hoje – não era, portanto, um problema na Alemanha Oriental. Circunstâncias semelhantes são evidentes em Cuba hoje, onde a taxa de vacinação contra a Covid-19 (cerca de 90% da população) é uma das mais altas do mundo, mas nenhuma medida coercitiva foi empregada.
A vacinação obrigatória era entendida na Alemanha Oriental socialista não como uma obrigação legal unilateral para o cidadão, mas como um dever do Estado e de suas instituições médicas. Monitorar e alcançar a cobertura vacinal o máximo possível foi uma prioridade central para os profissionais de saúde, especialmente para médicos e autoridades em nível municipal. Além dos serviços de imunização integrados aos locais de trabalho, creches e escolas, foram estabelecidos centros de vacinação permanentes onde os cidadãos podiam obter informações e agendar consultas para vacinações voluntárias adicionais, como contra o vírus da gripe. Até hoje, a vontade de ser vacinado contra a gripe continua significativamente maior na região da antiga Alemanha Oriental que na Ocidental.
Apesar das dificuldades temporárias na produção ou importação de vacinas, a RDA garantiu a imunização infantil universal até sua dissolução em 1990. Além disso, o número de casos de difteria foi reduzido drasticamente, a luta contra o sarampo avançou por meio de doses de reforço, apesar dos contratempos temporários, e a introdução de uma vacinação contra a tuberculose para todos os recém-nascidos ajudou a reduzir significativamente o número de casos. A RFA, que sempre esteve em uma posição financeira mais forte do que a RDA, também foi capaz de erradicar muitas doenças infantis, mas suas campanhas geralmente progrediram muito mais lentamente do que na Alemanha Oriental, como é evidente com o vírus da pólio.
O desmantelamento do sistema de saúde da RDA após 1990 foi acompanhado por uma diminuição na vontade de ser vacinado e uma crescente prevalência de doenças que antes estavam em declínio. Com a transição para um sistema de saúde voltado para o setor privado, a imunização tornou-se mais uma vez uma responsabilidade individual deixada ao critério dos pacientes e seus médicos de clínica geral, em vez de instituições estatais organizadas nacionalmente. Embora vários fatores contribuam para o surgimento de epidemias, o reaparecimento de casos de tuberculose e sarampo no leste da Alemanha unificada após 1990 é uma prova trágica da eficácia da estratégia de vacinação na RDA. O mesmo acontece com a taxa de vacinação particularmente baixa contra a Covid-19 no leste da Alemanha hoje, em grande parte fruto de uma crise de confiança no governo e no setor de saúde em geral.
Casos de tuberculose por 10 mil habitantes. Fontes: Deutsche Demokratische Republik [República Democrática Alemã]. Statistische Jahrbücher der DDR [Anuários Estatísticos da RDA]. Berlim: Staatsverlag der DDR, 1956–1991; Rahlf, Thomas, ed. Deutschland in Daten [Alemanha em Dados]. Bonn: Bundeszentrale für politische Bildung, 2015.
9. A cooperação internacional e a solidariedade médica da RDA
Em 8 de maio de 1973, a RDA tornou-se um membro reconhecido, igualitário e ativo da OMS ao lado de outros 145 Estados. A RFA era membro da OMS desde 1951 e, com sua pretensão de ser a única representante da Alemanha, havia dificultado a cooperação internacional da RDA no campo da saúde e seu acesso a recursos internacionais. Após sua admissão em 1973, a RDA tornou-se uma colaboradora proativa da OMS, sediando o Encontro Regional para a Europa da organização em 1981, juntamente com vários workshops da OMS. Também esteve ativamente envolvida no programa da OMS “Saúde para Todos até o Ano 2000”, especialmente sobre o conceito de atenção primária à saúde na Conferência Internacional de 1978 em Alma-Ata. Especialistas da RDA foram enviados à OMS como delegados, enquanto estudantes estrangeiros vieram estudar na Alemanha Oriental com bolsas de estudo da OMS. Além disso, 15 instituições médicas e projetos na RDA foram certificados como Centros Colaboradores da OMS, que apoiaram os programas globais da organização conduzindo pesquisas, coletando dados e promovendo o intercâmbio de experiências científicas e práticas.
Além disso, a cooperação entre os Estados socialistas era intensa, mas também limitada pelas diferenças nas capacidades de cada país. A RDA, por exemplo, forneceu muitos medicamentos e equipamentos médicos para a União Soviética e seus aliados, enquanto vários milhares de médicos da RDA receberam treinamento especializado nesses países.
A solidariedade internacionalista da RDA com países de todo o Sul Global incluiu vários projetos no setor de saúde. Houve acordos contratuais com mais de 40 países e organizações de libertação nacional, como a Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO) e o Congresso Nacional Africano (CNA). O espectro do internacionalismo médico da RDA incluiu o fornecimento de medicamentos e equipamentos, o envio de médicos e enfermeiros, o treinamento e a educação adicional de pessoal internacional e a construção e operação de hospitais. Por exemplo:
- O Hospital da Amizade RDA-Vietnã, hoje Hospital Viet-Duc (alemão-vietnamita), em Hanói, Vietnã, recebeu materiais médicos da RDA já em 1956.
- O Hospital Karl Marx foi construído na Nicarágua na década de 1980 e amplamente operado por médicos especialistas e técnicos da RDA. Em 1989, havia aproximadamente 90 funcionários trabalhando por lá, incluindo 25 médicos e outros 23 médicos de nível médio da RDA.
- Mais de 50 médicos e especialistas da RDA construíram e operaram o Hospital Tropical Metema, na Etiópia, de 1987 a 1988, para tratar vítimas da seca.
- Angola recebeu 27 ambulâncias por meio de doações solidárias da RDA em 1975. Em um centro de reabilitação na capital de Luanda, médicos da RDA trataram combatentes feridos do Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA). O centro também funcionava como uma escola para treinar enfermeiras e médicos locais.
- A RDA também enviou especialistas para o Camboja (no Hospital 17 de abril), Moçambique (nas cidades de Chimoio e Tete), Argélia (em Frenda, Mahdia e Oran), República Democrática Popular do Iêmen (em Aden) e Guiné (no centro técnico ortopédico em Conakry). Os pediatras da RDA também trataram pacientes na clínica da União Nacional dos Trabalhadores de Tanganica em Dar es Salaam, Tanzânia.
Além disso, médicos de países da África, Ásia e América Latina receberam treinamento especializado na RDA, e cerca de 700 pacientes estrangeiros eram tratados ali todos os anos. Enfermeiros e outros profissionais médicos de nível médio também receberam treinamento na Alemanha Oriental, na maioria das vezes na Faculdade de Medicina Dorothea Christiane Erxleben, que atraiu cerca de 2 mil estudantes de mais de 60 países e movimentos de libertação nacional durante seus 30 anos de existência. O internacionalismo médico da RDA foi caracterizado pela ajuda imediata e pelo compromisso de apoiar o desenvolvimento de longo prazo de serviços médicos autossustentáveis nos Estados emergentes.
“Trabalhadores contratados da Polônia, Moçambique, Mongólia e outros países sempre foram empregados em fábricas de processamento na indústria de carne. Como regra geral, os trabalhadores deveriam ter sido examinados quanto à condição física em seus países de origem antes de chegarem à RDA. No entanto, durante nossos exames de recrutamento, muitas vezes detectamos doenças graves nos pulmões, fígado, rins etc. Mas esses pacientes nunca foram enviados de volta. Em vez disso, foram internados em clínicas especiais, onde foram tratados gratuitamente, às vezes por meses. Isso foi a solidariedade da RDA na prática. Que contraste enorme [com a assistência em saúde] após a “reunificação” em 1990, quando, por exemplo, um pai desesperado, da Rússia, aproximou-se de mim com seu filho sofrendo de um tumor. Médicos do Hospital Charité estavam dispostos a operá-lo, mas os fundos não puderam ser garantidos. Na mídia de hoje, muitas vezes ouvimos pessoas implorando por dinheiro para ajudar crianças gravemente doentes do exterior – isso sempre me deixa triste e irritado ao mesmo tempo. O “empobrecido” na RDA nunca precisou implorar por gestos tão humanistas! ‘
— Dr. Renate Rzesnitzek, radiologista da policlínica corporativa de uma empresa de carne de Berlim
10. Por que o socialismo é a melhor profilaxia?
Com a incorporação da Alemanha Oriental à RFA em 1990, o esforço de 40 anos da RDA para construir um sistema de saúde fundamentalmente diferente foi encerrado. A infraestrutura médica e a equipe da antiga RDA foram engolidas pelo sistema da Alemanha Ocidental que, por sua vez, estava envolvido em uma onda de comercialização neoliberal desde meados da década de 1980. As cadeias hospitalares corporativas surgiram em toda a Alemanha nas décadas seguintes, e o modelo de consultório particular de atendimento ambulatorial foi imposto novamente no Leste. O lucro passou a dominar a profissão médica mais uma vez, como contou Irene, ex-enfermeira em uma das policlínicas da RDA. “Em 1993, os médicos começaram a estabelecer seus consultórios particulares. Depois que minha médica-chefe assistiu a uma aula sobre trabalho autônomo, ela nos disse: ‘aprendi hoje que existem três princípios de trabalho autônomo no novo sistema. Primeiro, devemos sempre ser gentis com os pacientes para que eles gostem de vir até nós. Em segundo lugar, devemos descobrir o que podemos ganhar com o paciente. Quanta receita eles gerarão para nós? E o terceiro princípio: não podemos permitir que eles fiquem saudáveis’. Essa foi a minha experiência com a mudança do sistema após 1990, e tem sido minha sensação geral no setor de saúde desde então”.
A reimposição de práticas médicas com orientação comercial na Alemanha Oriental tornou ainda mais claro o contraste entre os cuidados de saúde capitalistas e socialistas. Enquanto o mercado transforma doenças em mercadorias e pacientes em clientes, a medicina socialista busca prevenir a doença, para começar, tornando o bem-estar humano seu princípio orientador. Como em outros Estados socialistas, como Cuba, a prevenção permaneceu o princípio orientador da abordagem da RDA na saúde durante toda a sua existência. Uma vez que a motivação pelo lucro foi eliminada da Medicina e da Economia, não havia razão para que indivíduos e trabalhadores pudessem adoecer.
Na RDA, a ênfase política foi colocada na medicina social – ou seja, no reconhecimento e combate sistemáticos dos determinantes socioeconômicos da saúde e da doença, em vez de uma abordagem que se concentra apenas em como elas se manifestam no nível individual. Embora a medicina social e individual forneça perspectivas cruciais para a prevenção e o tratamento de doenças, as políticas destinadas para a melhoraria da saúde da população serão inevitavelmente restritas se o contexto social geral e as causas profundas da doença forem desconsiderados.
“Durante toda a minha vida política (…) vi o mundo pelos olhos de um médico, para quem a pobreza, a miséria e as doenças são os principais inimigos. Foi assim que cheguei ao comunismo, e foi assim que tive a sorte de experimentar na RDA um sistema social e de saúde que estabeleceu uma estrutura impressionante; um sistema social e de saúde para toda a população, como eu nunca tinha visto antes. […] Não sou acrítico à antiga RDA e não glorifico seu passado. […] Mas uma coisa eu sei com certeza: ela nunca teria me afastado das ideias do socialismo, pois cheguei a elas por meio de experiências nunca esquecidas sob o capitalismo. […] A melhor, mais humana e científica medicina, em última análise, permanece impotente sob condições de miséria social. O estado do mundo atual fornece a evidência mais convincente e horrível disso. Mas o inverso também é verdadeiro: mesmo o melhor ambiente social é impotente diante de doenças se não houver medicamentos da mais alta ordem científica e humanística”.
— Ingeborg Rapoport (1912 – 2017), professora de pediatria que ocupou a primeira cadeira no campo acadêmico da neonatologia na Europa, emigrou da Alemanha nazista para os EUA como estudante de medicina e se reinstalou na RDA em 1952.
O atendimento ambulatorial, que tem sido o foco central deste estudo, reflete de forma mais marcante a distinção entre um sistema de saúde capitalista e um socialista. Instalações ambulatoriais e profissionais na Alemanha Oriental foram integrados em todas as áreas da sociedade, desde locais de trabalho e escolas até bairros urbanos e zonas rurais. As várias instituições médicas do país estavam interligadas em uma rede unitária que promovia a cooperação em vez da competição. Essa extensa infraestrutura funcionava como um sistema de alerta precoce que poderia identificar e neutralizar desenvolvimentos prejudiciais onde e quando eles surgissem. O campo da saúde ocupacional foi particularmente importante, pois permitiu que as ligações entre trabalho e doença fossem examinadas e abordadas. Da mesma forma, a integração dos cuidados preventivos em creches e instituições educacionais transformou as questões de saúde em uma responsabilidade social assumida não apenas pelos pais, mas também por professores, médicos e funcionários públicos.
O que mais se destaca no contexto da Alemanha Oriental são as conquistas na política de saúde, apesar das dificuldades enfrentadas pela sociedade. Situada na linha de frente da Guerra Fria, a Alemanha Oriental foi fortemente sancionada e teve dificuldades para importar tecnologia e equipamentos médicos modernos. Ao mesmo tempo, as condições de trabalho foram prejudicadas pelas necessidades de reindustrialização após 1945, o que muitas vezes implicava trabalho árduo e exposição à poluição por carvão marrom. Os primeiros anos do país também foram marcados por uma grave escassez de mão de obra no setor de saúde, à medida que profissionais médicos foram atraídos para o oeste. No entanto, apesar desses desafios, o Estado socialista foi capaz de fazer uso de seus recursos limitados para melhorar progressivamente a situação social e a saúde da população e, no processo, a profissão médica foi revolucionada para quebrar as hierarquias tradicionais. O campo da medicina foi aberto à classe trabalhadora e ao campesinato, enquanto a transição dos consultórios particulares para as policlínicas ajudou a corroer os privilégios dos médicos sobre os enfermeiros e assistentes, à medida que ex-empregadores e funcionários se tornaram colegas.
Esses sucessos foram possíveis graças a dois grandes desenvolvimentos políticos. Primeiro, a saúde se tornou uma prioridade social na Alemanha Oriental após a Segunda Guerra Mundial. Enquanto na era de Weimar as políticas de saúde tinham que ser conquistadas pelos sindicatos e concedidas pela classe capitalista, a RDA era um Estado operário e camponês; os direitos de saúde, sociais e culturais estavam consagrados na constituição, com a aplicação desses direitos supervisionada pelos próprios trabalhadores. O segundo fator foi a socialização das relações de propriedade na Alemanha Oriental, que criou a estrutura para um sistema de saúde unitário e integral. A organização centralizada da indústria, habitação, medicina e educação do Estado fez com que os objetivos na saúde pudessem ser discutidos e implementados em relação a outros objetivos sociais, econômicos e políticos. Assim, foi estabelecido um vínculo abrangente entre a política de saúde e todas as áreas da sociedade. Embora os debates políticos fossem muitas vezes ferozes, uma base prática para tais discussões havia sido criada pela primeira vez.
Hoje, para justificar a privatização dos sistemas de saúde em todo o mundo, somos informados de que os mercados garantem a alocação mais eficiente de recursos na sociedade. No entanto, quando o vírus da Covid-19 ceifou milhões de vidas e destruiu sistemas de saúde já debilitados até mesmo em Estados mais ricos, a ineficiência do mercado e a desumanidade da propriedade privada ficaram mais evidentes do que nunca. A RDA demonstrou que uma alternativa é possível – aquela que coloca o bem-estar humano no centro, impulsionada e gerenciada por trabalhadores. Mesmo sob condições de severa restrição econômica, o socialismo provou que cuidados preventivos, tratamento eficaz e emprego digno podem ser garantidos para todos. De fato, Cuba embargada continua provando esse ponto hoje, não apenas fornecendo cuidados de saúde exemplares para seu povo, mas também atendendo aos necessitados em todo o mundo. Os sistemas de saúde do futuro encontrarão seus projetos nas sociedades socialistas desses Estados como Cuba e a RDA.
Agradecimentos:
Este estudo foi produzido em colaboração com o Dr. Heinrich Niemann (nasc. 1944), que trabalhou como especialista em medicina social na RDA e atuou como conselheiro distrital de saúde em Marzahn-Hellersdorf, Berlim, durante a década de 1990. A seção sobre psicologia ocupacional foi em coautoria com o Dr. Klaus Mucha, psicólogo ocupacional. Também recebemos contribuições importantes de entrevistas com o Dr. Herbert Kreibich (nasc. 1943), especialista em saúde ocupacional que liderou o Instituto Central de Medicina Ocupacional da RDA de 1983 a 1990; Irene (nasc. 1940), ex-enfermeira da RDA que trabalhou em uma policlínica em profilaxia de medicina esportiva e em um ambulatório empresarial (ela pediu que seu sobrenome fosse omitido por motivos pessoais); e Dr. Rüdiger Feltz (n. 1958), especialista em neurocirurgia que foi médico praticante na RDA e hoje na República Federal da Alemanha. Todas as entrevistas foram realizadas entre maio e novembro de 2021 em Berlim.
Bibliografia
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Feltz, R. (especialista em neurocirurgia que era médico praticante no DDR e hoje na República Federal), entrevista Zoom com os autores. 25 de maio de 2021. Berlin/Erfurt.
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Irene (ex-enfermeira do DDR que trabalhou em uma policlínica, na profilaxia da medicina esportiva e em um ambulatório empresarial), em discussão com os autores. 21 de junho de 2021. Berlim-Treptow.
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Créditos das imagens
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Imagem 1: Logo do Sistema de Saúde Proletário.
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Imagem 3: Bartocha, Benno. Sala de prescrição da farmácia Friedland. 8 dez. 1975. Fotografia. Wikimedia Commons/Arquivo Federal Alemão, imagem 183-P1208-0025/CC-BY-SA 3.0.
Imagem 4:Ritter, Steffen. Policlínica de Berlim. 9 dez. 1986. Fotografia. Wikimedia Commons/Arquivo Federal Alemão, imagem 183-1986-1209-014/CC-BY-SA 3.0.
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